sábado, 6 de fevereiro de 2010

UM POUCO DE EVELYN UNDERHILL (1875-1941)

A Vida de Oração e Adoração

É, pois, simplesmente, essencial dedicar ou conseguir, de algum modo, tempo para treinar a si mesmo nesse amor e nessa oração, a fim de desenvolver esses poderes. É bem verdade que em essência eles nos são “concedidos”, mas esse dom só se torna completamente nosso por meio de um paciente e generoso esforço da alma. Conquistas espirituais custam muito, embora nunca custem tanto quanto valem. Isso significa, no mínimo, o exercício consistente de uma faculdade que a maioria de nós permitiu que se tornasse frouxa.

O que é, então, um verdadeiro homem de oração? É alguém que deliberadamente deseja e consistentemente aspira que seu relacionamento com Deus e com as outras almas seja controlado e operado a cada ponto pelo próprio Deus; alguém que desenvolveu e educou seu sentido espiritual a tal ponto que seu ambiente sobrenatural é mais real e sólido para ele do que o seu ambiente natural. Um homem de oração não é necessariamente uma pessoa que pronuncia uma certa quantidade de ofícios devocionais, ou que abunda em intercessões detalhadas; mas é um filho de Deus que é e que reconhece a si mesmo como alguém unido a Deus no mais profundo de sua alma e que é completa e inteiramente guiado pelo Espírito Criador em suas orações e obras. Não se trata apenas de linguagem piedosa. É uma descrição a mais real e concreta que posso fazer, e a única vida verdadeiramente apostólica. Cada cristão começa com a mesma chance de alcançar isso, mas poucos o desenvolvem. ...

Estou cada vez mais convencida de que apenas uma espiritualidade que desse modo coloque toda a ênfase na Realidade de Deus, perpetuamente em sintonia com Ele, perdendo-se n’Ele, recusando-se a permitir que nem mesmo o trabalho mais extenuante ou os problemas práticos, ou ainda o pecado e o fracasso, a distraiam do seu foco em Deus; somente essa espiritualidade é um fundamento seguro para a obra divina.

Só ela pode manter vivo e atento o senso de adoração dos mistérios no meio dos quais nos movemos, a consciência da pequenez da porção que nós, na melhor das hipóteses, conseguimos apreender deles e, ainda assim, considerando essa imensidão e nossa pequenez, maravilhar-se com o que nós de fato conhecemos e sentimos.

Uma grande mulher do século passado, Madre Janet Stuart, costumava dizer a suas noviças: “Pensem pensamentos gloriosos sobre Deus – e sirvam a Ele com uma mente sossegada!” E é, certamente, um fato que quanto mais gloriosos e mais grandiosos forem nossos pensamentos sobre Ele tanto maior será a quietude e a confiança com que faremos nossas obras.

É apenas por meio de adoração atenta que fazemos nossas descobertas pessoais sobre Ele. Acho que se só tivermos meia hora para dedicar às nossas orações particulares cada manhã, não será muito fazer com que nossas mentes gastem metade desse tempo em tal adoração. Pois esse é o culto central que Deus requer das almas humanas e a negligência a ele é responsável por grande parte da ausência de profundidade e de poder espiritual.

No fluir das ondas de tal oração de adoração, a alma é libertada das pressões e confusões da vida temporal; ela é elevada para acima de controvérsias fúteis, de preocupações fúteis e de vaidades – e nenhum de nós está isento dessas coisas. Ela é conduzida a Deus e escondida n’Ele. Esse é o único caminho pelo qual podemos alcançar aquele esquecimento de si mesmo que é o fundamento da paz e do poder; os quais nunca podem ser nossos enquanto fizermos de nossa oração um mero meio de obtenção de dons de Deus para nós mesmos ou para outros, ao invés de torná-la um ato de consagração pessoal sem medida.

Estou certa de que nós, gradual e imperceptivelmente, aprendemos mais sobre Deus por meio dessa persistente atitude de humilde adoração do que podemos esperar conseguir com qualquer quantidade de investigação mental. Isso porque nela nossa alma recupera, ainda que por um momento apenas, a relação fundamental do frágil espírito criado com sua Fonte Eterna, e será bem empregado todo o tempo que for usado para apreender essa relação e para mantê-la corretamente. Nela respiramos profundamente a atmosfera da Eternidade e, quando fazemos isso, humildade e senso comum se tornam a mesma coisa. Nós percebemos e reconstruímos a nossa fraqueza e nulidade, assim como a grandeza e constância de Deus.

In “The very thought of Thee” org. por Steere, D. V. e Batten, J. M.

Tradução: Fernando Sabóia Vieira

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