terça-feira, 30 de dezembro de 2014

Ano Novo

Caros companheiros de jornada em busca da vida interior,

Republico esse singelo poema que me acompanha há duas décadas.



Ano Novo
“Eu Sou o Alfa e o Ômega, o Começo e o Fim...

Não começar nada
Sem Aquele que é o Começo de tudo
O Princípio
O Renovo
O Alfa
A Sabedoria da criação

Não continuar nada
Sem Aquele que é o Sentido de tudo
A Palavra
A Força
A Alegria
O Dom de existir

Não alcançar nada
Sem Aquele que é o Fim de tudo
O Alvo
O Destino
O Ômega
A Vida abundante

Fernando Sabóia Vieira
De “Café com Poesia”, meados da década de 90.

quinta-feira, 25 de dezembro de 2014

O nascimento de Jesus, morte da morte

São Basílio - O nascimento de Jesus, morte da morte.


São Basílio (c. 330-379), monge, bispo de Cesareia da Capadócia, doutor da Igreja
Homilia para o nascimento de Cristo, 2,6; PG 31, 1459

O nascimento do Salvador, morte da morte

Deus na terra, Deus entre os homens! Já não é Aquele que dá a sua Lei no meio dos relâmpagos, ao som da trombeta, no alto da montanha fumegante, na obscuridade de uma trovoada aterradora (Ex 19,18), mas Aquele que se relaciona com doçura e bondade, num corpo humano, com os seus irmãos. Deus na nossa carne! Já não é Aquele que age apenas em alguns momentos, como fazia com os profetas, mas Aquele que assume plenamente a natureza humana e que, pela sua carne que é a nossa carne, eleva a Si todos os homens.


Como foi que a luz veio a todos por um só? De que maneira está a divindade na carne? Está como o fogo no ferro […]: permanecendo no seu lugar, o fogo comunica ao ferro o seu ardor próprio; e, sem ficar diminuído, enche por completo o ferro ao qual se comunica. Da mesma forma, Deus, o Verbo que «habitou entre nós», não saiu de Si mesmo; o Verbo que Se fez carne não Se submeteu à mudança; o Céu não ficou privado daquele que o continha e a terra acolheu Aquele está no Céu. […]


Entra plenamente neste mistério: Deus veio à carne para matar a morte que nela se escondia. Assim como os medicamentos nos curam logo que são assimilados pelo corpo, assim como a obscuridade que reina numa casa se dissipa quando a luz lá entra, assim também a morte que nos tinha em seu poder foi anulada pela vinda do nosso Deus. Assim como o gelo formado durante a noite se funde sob o calor dos raios solares, assim também a morte reinou até à manifestação de Cristo. Mas logo que o Sol de justiça se elevou (Mal 3,20), «a morte foi absorvida pela vitória» (1Cor 15,54), pois não podia suportar a presença da verdadeira vida. […] Demos glória com os pastores, dancemos em coro com os anjos «pois um Salvador nos nasceu hoje, que é Cristo Senhor» (Lc 2, 11). […] Festejemos a salvação do mundo, o dia do nascimento de toda a humanidade.





segunda-feira, 13 de outubro de 2014

“Não impeçam as criancinhas, pois delas é o reino de Deus”


 
 
     Irmãos queridos,

 
     Essa frase de Jesus está em um bem conhecido e muito citado texto registrado nos três Evangelhos sinóticos – Mateus 19:13-15; Lucas 18:15-17 e Marcos 10:13-16.

     Alguns detalhes chamam nossa atenção nesse gentil episódio da vida de Jesus: sua “indignação” com os que estavam impedindo o acesso das crianças a ele; a declaração de que o reino dos céus pertence a elas e a afirmação enfática de que quem não receber o reino como uma delas não terá acesso a ele.

     Quero comentar os dois primeiros desses aspectos, o de que o Reino pertence às crianças e o de que não devemos impedi-las de ir até o Senhor.

     Um ensino bem estabelecido na Igreja, fundamental mesmo, é o da malignidade natural do homem por causa do pecado. Quando consideramos a educação dos filhos e a formação das crianças levamos isso muito seriamente em conta, uma vez que essa tendência ou inclinação para o mal precisa ser corrigida e que é necessário que cada uma se arrependa e se converta.

     No entanto, nesse texto, Jesus afirma outro fato que também deve ser considerado em relação às crianças, sob pena de sermos contados entre os que as “impedem” de ir até o Senhor. É que elas, mesmo tendo nascido no pecado, pertencem naturalmente ao Reino. Devemos nos lembrar de que a natureza humana não é maligna em sua origem criacional. Ela foi corrompida, distorcida, deformada pelo pecado, mas não completamente destruída em sua imagem e semelhança de Deus. E, como afirmamos, o propósito eterno de Deus é exatamente dar plenitude a essa imago Dei, restaurando o que foi perdido com o pecado e levando o homem à comunhão completa e sem obstáculos com seu Criador.

     Assim, se toda criança tem uma inclinação natural para o mal, tem, mais forte e fundamentalmente ainda, uma potencialidade espiritual para o bem, porque foi criada por Deus para isso, para compartilhar Sua Natureza e Sua Vida, em comunhão com Ele. Uma diferença é que enquanto o mal, na nossa presente condição, é natural, o bem deve ser aprendido.

     Na formação das crianças e educação dos filhos é necessário conter a inclinação natural para o mal. No entanto, mais importante do que isso, creio, é despertar, estimular, exercitar e tornar plenamente vivido o potencial espiritual para a verdade, para o bem, para a santidade. É nesse sentido que entendo as palavras de Jesus de que às crianças pertence o Reino e de que nós não devemos impedir, atrapalhar, embaraçar o caminho delas até o Senhor.

     As crianças que nascem na Igreja ou que são a ela conduzidas devem ser, antes de tudo, formadas, educadas, instruídas para que cresçam em “sabedoria, estatura e graça” (Lucas 2:40), aprendendo, desde cedo, as “sagradas letras” que podem torná-las “sábias para a salvação” (2ª a Timóteo 3:14-17). Nosso enfoque principal deve ser a formação, a instrução, a educação. A conversão é um trabalho do Espírito Santo com o qual cooperamos cumprindo nossos papéis e não as “impedindo” de ir a Jesus por nossa negligência e erros.

     Mas de que maneiras nós podemos “impedir” as crianças de conhecerem Jesus? Quero sugerir alguns pontos inicias para reflexão. A maior parte deles se expressa como paradoxos, destacando princípios que concorrem ou mesmo se contrapõem, nos obrigando à reflexão, oração, conselho e dependência de Deus para alcançar a sabedoria necessária para lidar com situações concretas.

     Destaco que são apenas tópicos enunciados e ainda não desenvolvidos. Espero que possam ser úteis para nossas conversar sobre o tema.
 

IMPEDIMOS AS CRIANÇAS DE IREM ATÉ JESUS:
 

1. Quando não damos a elas a instrução necessária nas sagradas letras, mesmo quando as instruímos em tantas outras coisas úteis para a vida.

 

2. Quando não somos exemplos, não somos imitáveis, apesar de nossos erros e imperfeições. A busca de sermos exemplos não pode nos levar a sermos hipócritas. O reconhecimento de nossos pecados e erros não nos exime da obrigação de sermos exemplos para nossos filhos.

 

3. Quando não as incluímos na vida da Igreja, mesmo quando a Igreja se mostra imperfeita e cheia de falhas. Muitos pais cometem o erro de pretender “proteger” os filhos dos erros da Igreja e os levam a uma atitude de rejeição do Corpo ao qual devem pertencer.

 

4. Quando não as criamos para o Reino, mas para a vida no mundo, para nós mesmos ou para elas mesmas. Isso tem a ver com a formação de uma mentalidade, de valores, virtudes, atitudes, aptidões etc.

 

5. Quando não lhes damos um ambiente de liberdade para conhecer, se expressar, experimentar, examinar, perguntar, responder, exercitar suas faculdades, sem perder o foco no propósito de Deus. Instruir, formar e educar são diferentes de domesticar e adestrar. Amar, que é o propósito final de tudo, pressupõe liberdade. Só os seres livres amam.

 

6. Quando não as protegemos suficientemente e quando as protegemos demasiadamente. As crianças não devem ser expostas a situações com as quais não estejam prontas a lidar, mas devem ser preparadas para, quando adultas, lidarem com quaisquer situações, o que só se pode aprender no exercício prático, nas provações que forjam o caráter.

 

7. Quando queremos determinar seu futuro (ministério, profissão, casamento etc) e quando nos omitimos em aconselhá-las e orientá-las quanto ao seu futuro.

 

8. Quando fazemos delas o sentido de nossas vidas e quando nos fazemos o sentido da vida delas. Os filhos não devem criados como se fossem o centro da família nem como se os pais fossem o centro da família. Deve ser sempre claro para todos que o centro é Jesus.

 

9. Quando não aceitamos com paz e alegria a mudança de nosso papel em suas vidas ao longo do tempo, especialmente a diminuição de nossa autoridade e controle sobre eles.

 

10.        Quando as tratamos como eternas crianças e quando as tratamos como mini adultos. As crianças são pessoas em formação. É importante respeitar casa fase e trabalhar para que prossigam no seu desenvolvimento.

 

11.        Quando supomos que nunca vamos errar, e não nos preparamos para lidar com os erros, e quando consideramos os erros inevitáveis e não trabalhamos para que não ocorram ou não se repitam.

 

12.        Quando não as amamos incondicionalmente e quando deixamos de manifestar a luz de Deus em suas vidas: a verdade com amor, o amor se alegra com a verdade, graça e verdade.

 

Amados irmãos, companheiros de jornada. Não que a tarefa seja simples. Em verdade, ela está muito além de nossas possibilidades. Por isso, é fundamental que nos lembremos de que estamos apenas cooperando com um projeto que tem como idealizador e realizador o Deus Altíssimo, Criador e Sustentador de todas as coisas, que age em tudo e em todos e nos concedeu o Seu Espírito Santo para nos santificar e capacitar.

Espero seus comentários, ponderações, correções.

“A graça de Jesus seja com todos” (Apocalipse 21:21).

 
Brasília, no dia das crianças de 2014, AD.

Fernando Sabóia Vieira

quarta-feira, 24 de setembro de 2014

LOUVOR E ADORAÇÃO


 

Caríssimos companheiros de jornada em busca da vida interior,

          Tive um sonho. Nele, estava com vários irmãos preparando um encontro da Igreja quando, num momento de inspiração repentina, era levado a escrever numa pequena folha de papel algumas frases sobre louvor e adoração, diferenciando-os como duas dimensões distintas do estar diante da Presença de Deus.

     Compartilho o que escrevi e aonde isso me levou como reflexão.

     O louvor é a verticalidade, a exaltação de Deus, de Sua excelsa e imperscrutável Pessoa, de Seu Caráter e de Seus Tremendos feitos. Ele é o Altíssimo, o Totalmente Outro, tão distante e diferente de mim em sua Santidade, Justiça, Verdade e Perfeição. Tributar ao Senhor o louvor que lhe é devido, essa é a exortação do Saltério. Louvar a Deus é justo, é o adequado reconhecimento de quem Ele é. Em sua Presença sou cheio de temor e de consciência de Seu Eterno Poder e compreendo minha pequenez de criatura e minha indignidade de pecador.

     O louvor não produz, assim, necessariamente, um relacionamento pessoal com aquele a quem eu exalto e elogio. Pode mesmo, ao contrário, levar a uma distância.

     A adoração é a integração, a união da minha mente e do meu coração com esse Deus Altíssimo, é a resposta profunda da minha alma à atração e ao fascínio que Sua Presença provoca em mim. É a descoberta não apenas de quem eu sou, mas também de a quem pertenço. Quando adoro, não me limito a reconhecer e declarar que Ele é o Deus Santo, digno de toda honra e glória, mas também me dou conta de eu fui criado para participar de Sua existência e natureza divina e gloriosa. É o encontro com Sua Graça, Misericórdia e Amor. É prostrar-me, consagrar-me, dedicar-me inteiramente ao serviço de quem assim me conquistou.

     O Senhor busca adoradores que o adorem em espírito e em verdade, disse Jesus. Não apenas ser reconhecido com Deus, mas amado como Pai.

     O louvor pode ser visto como uma obrigação, a adoração é voluntária. O louvor nasce do reconhecimento de um fato – de que Deus existe e é Santo. A adoração tem sua fonte no relacionamento com uma Pessoa, que me ama e me chama para pertencer a ela. A adoração pode fluir do louvor, e o louvor é a consequência necessária da adoração. São, de fato, inseparáveis quando têm por objeto o Deus Vivo. Quando reconheço a excelência de Deus e a magnificência de Seus feitos sou levado a adorá-lO; quando O adoro fluem do meu coração e dos meus lábios expressões que louvam Sua maravilha e santidade.

     Não pretendo fazer entre louvor e adoração uma distinção teológica rigorosa. São dimensões de nosso culto a Deus, respostas do nosso ser – corpo, alma e espírito - diante da Infinita Presença de Deus, expressões de nosso encontro com o Sagrado, que nos provoca, ao mesmo tempo, temor e fascinação diante do seu mistério – "mysterium tremendum et mysterium fascinans" (Rudolf Otto).

Somos, ademais, exortados pelas Escrituras a oferecermos a Deus “sacrifícios de louvor” e a multiplicarmos entre nós os “salmos, hinos e cânticos espirituais”, “com ações de graças” em todas as nossas petições e súplicas. Essas práticas nos levam a reconhecer a dimensão transcendente, espiritual, eterna e significativa da vida comum, a despertar nossa consciência para a realidade última que envolve todas as coisas no Ser Infinito de Deus, a participar do Seu propósito eterno que a todo tempo tudo faz convergir para Ele mesmo. Nosso pensar e nosso sentir vão, nesse caminho, permanecendo cada vez mais tempo na Presença e passamos, por meio da transparência do Seu Rosto a nos iluminar, a vê-lO, a contemplá-lO e a amá-lO e, assim, a sermos transformados em Sua própria Imagem.

     Foram essas as paragens a que me conduziu meu sonho com o louvor e a adoração, tão essenciais para que a jornada seja menos árdua de esforços e mais cheia de contentamento com a Presença.

     Que a graça de Jesus seja com todos.

     Brasília, primeiro dia da primavera de 2014, AD.

     Fernando Sabóia Vieira 

quinta-feira, 26 de junho de 2014

Sobre a Rocha


São Gregório de Nazianzo (330-390), bispo, doutor da Igreja
Discurso 26

Edificados sobre a Rocha

Certa noite, andava eu a passear à beira-mar e, como diz a Escritura, «soprando uma forte ventania, o lago começou a agitar-se» (Jo 6,18). As vagas elevavam-se ao longe e invadiam a praia, batendo nos rochedos, desfazendo-se e transformando-se em espuma e em gotículas. Os seixos pequenos, as algas e as conchas mais leves eram arrastados pelas águas e atirados para a praia, mas os rochedos permaneciam firmes e inabaláveis, como se tudo estivesse calmo, mesmo no meio das vagas que os assolavam. […]


Retirei uma lição desse espectáculo. Esse mar não será a nossa vida e a condição humana? Também aqui se encontra muita amargura e instabilidade. E não serão como os ventos as tentações que nos assolam e todos os golpes imprevistos da vida?

 Era nisso, segundo penso, que meditava David quando clamava: «Salva-me, ó Deus, porque as águas quase me submergem; estou a afundar-me num lamaçal profundo, não tenho ponto de apoio; entrei no abismo de águas sem fundo e a corrente está a arrastar-me» (Sl 69,2ss).

Entre as pessoas que são postas à prova, umas parecem-me objectos ligeiros e sem vida que se deixam levar sem oferecer a mínima resistência; não têm nenhuma firmeza em si; não têm o contrapeso duma razão sábia que lute contra os assaltos.

 Outras parecem-me rochedos, dignas dessa Rocha sobre a qual fomos edificados e que adoramos; formadas nos raciocínios da verdadeira sabedoria, elevam-se acima da fraqueza comum e tudo suportam com uma constância inabalável.






quarta-feira, 25 de junho de 2014

A Arte de Envelhecer

ARTE DE ENVELHECER


Recebi um dia desses uma correspondência do meu dileto amigo Cairos. Eu já estava, em verdade, sentindo falta de suas provocativas e criativas reflexões sobre a vida, frutos de sua vocação para filósofo desocupado e pensador do caos cotidiano.
        Bem, ele não me decepcionou. Encaminhou-me esse texto que compartilho com vocês, embora fuja um pouco à proposta deste espaço virtual.
Se tiverem algum comentário ou queixa comprometo-me a transmitir a ele, sem muita esperança de que reconsidere. Trata-se de um obstinado a pensar por conta própria.

Reflexões sobre
A VETUSTA E QUASE ESQUECIDA
ARTE DE ENVELHECER

Cairos Anann Cronn

            Conselhos que dou a mim mesmo, nesta quadra estranha da vida.
1)    Escolher minhas demências senis. Não supor que não as terei. Melhor preferir algumas a ser vítima de quaisquer.

2)    Evitar o ridículo de querer se manter eternamente jovem e o patético de ser um velho covarde.

3)    Manter a autocrítica, o senso do ridículo. Não pode haver nada mais ridículo do que um velho ridículo que não se enxerga mais.

4)    Evitar o modernismo e também o anacronismo. Viver na suspensão do tempo. Esse é um dos privilégios da idade: não ter que ir nem ter que voltar

5)    Ser cada vez mais sério: ninguém suporta – pelo menos eu não – um velho debochado.

6)    Falar cada vez menos. O silêncio fica bem nos mais velhos, combina com as longas estradas percorridas.

7)    Reconhecer os novos limites e saber que alguns serão insuperáveis. “Olimpíadas” da terceira idade são a quintessência da degradação humana.


8)    Não contar histórias a quem não quer ouvi-las e, principalmente, não contá-las várias vezes.

9)    Ouvir as histórias dos outros, com cada vez maior atenção. Elas levam a mundos alternativos e fantásticos, cheios de aventuras, dramas e riquezas humanas.

10)                      Tentar aprender sempre algo novo, de preferência por puro prazer.

11)                      Manter o máximo de autonomia, mas aceitar ajuda. Quem não aceita ajuda acaba dando mais trabalho.

12)                      Terminar o que já foi começado, antes de iniciar projetos que não se poderão concluir.

13)                      Conviver cada vez mais com os mais jovens. Eles são janelas para os futuros que eu não verei.

14)                      Evitar a futilidade e a frivolidade. São afrontas ao dom precioso da vida e um desrespeito profundo a si mesmo.

15)                      Valorizar o tempo, não ter pressa para o que for belo, significativo e eterno, sem se perguntar se é “útil” ou “produtivo”.

16)                      Manter uma razoável quantidade de dúvidas na mente. Recusar as explicações “cabais”: elas encolhem a alma.

17)                      Nunca deixar de se admirar com a vida, com o mundo, manter-se perplexo diante das coisas mais cotidianas.

18)                      Manter o olhar para adiante, isto é, para a eternidade, embora a curva na estrada e a nuvem escura no horizonte.
19)                      Aceitar as críticas e admoestações, não obstante a arrogância dos jovens e a impaciência dos velhos. Você está entre uma coisa e outra.
20)                      Não desejar nem temer a morte. “Sê bravo, sê forte, não fujas da morte, que a morte há de vir” (GD).

21)                      Muito cuidado com o ceticismo. Aparência de sabedoria ele tem, mas“lado negro da força ele é” (MY).

22)                      Aceitar as incompletudes da vida para poder viver plenamente.

23)                      Evitar conversar comigo mesmo e com meus amigos invisíveis – ausentes, falecidos, fictícios – diante de pessoas que não têm esse nível de transcendência espiritual.

24)                      Não esperar das pessoas o que elas não têm para dar, mesmo quando elas pensam que sim e o prometem: “de onde menos se espera, daí é que não saí nada mesmo” (BT).

25)                      A sabedoria do tempo é: eu antes NÃO sabia apenas superficialmente as coisas que hoje não sei profundamente.

26)                      Não tentar mudar a ninguém exceto a mim mesmo.

27)                      Não reclamar: as coisas e as pessoas que nunca se importaram não começarão a se importar agora.

28)                      Não falar alto. As pessoas não estão ficando surdas, Elas apenas não estão sempre interessadas no que tenho a dizer.

29)                      Não ficar com raiva quando tomam minha insistência por idiotia – talvez seja mesmo.

30)                      Fazer de tudo para não perder mais nenhum por do sol, ECLIPSE, lua cheia ou passagem de cometa.          

terça-feira, 17 de junho de 2014

O sol se levanta sobre bons e maus

Juliana de Norwich

 (1342-depois de 1416), mística inglesa
«Revelações do amor divino», cap. 35

«Ele faz com que o Sol se levante sobre os bons e os maus»

Tudo acabará em bem: a plenitude da alegria consiste em ver Deus em tudo. Através do mesmo poder, sabedoria e amor benditos com que criou todas as coisas, Ele conduz tudo continuamente para o mesmo objectivo e encaminhará tudo para Ele. Quando chegar a altura, vê-lo-emos claramente. […] Tudo o que Nosso Senhor faz é justo; tudo o que permite contribui para o seu desígnio – o bem e o mal. Porque tudo o que é bom é obra de Nosso Senhor; e o que é mau, Ele o permite. Não digo com isto que o mal seja válido; digo que aquilo que Nosso Senhor permite contribui para o seu desígnio. Deste modo, a sua bondade será conhecida para todo o sempre, bem como as maravilhas da sua humildade e da sua doçura nesta obra de misericórdia e de graça. […]


O próprio Deus é a rectidão por excelência; todas as suas obras são justas, ordenadas que estão desde toda a eternidade pelo seu grande poder, a sua grande sabedoria, a sua grande bondade. Tal como estabeleceu tudo da melhor maneira, assim opera sem cessar com rectidão e conduz todas as coisas até ao seu fim. […] Nós estamos protegidos maravilhosamente e para sempre nesta rectidão, mais do que qualquer outra criatura.


E a misericórdia é uma obra que provém da bondade de Deus; ela manter-se-á enquanto for permitido que o pecado atormente as almas justas. […] Deus permite as nossas quedas; mas protege-nos pelo seu poder e a sua sabedoria. Pela sua misericórdia e a sua graça, eleva-nos a uma alegria infinitamente maior. É assim que Ele quer ser conhecido e amado: na rectidão e na misericórdia, agora e para sempre.

quarta-feira, 19 de março de 2014

Quem se Humilhar Será Exaltado

Madre Teresa de Calcutá (1910-1997)

fundadora das Irmãs Missionárias da Caridade
No Greater Love

«Quem se humilhar será exaltado»


Não creio que haja alguém que precise tanto do socorro e da graça de Deus como eu. Por vezes sinto-me muito desarmada e fraca. E acredito que é por isso que Deus Se serve de mim. Uma vez que não posso contar com as minhas próprias forças, volto-me para Ele vinte e quatro horas por dia. E se o dia tivesse mais horas precisaria também da sua graça durante essas horas. Todos devemos agarrar-nos a Deus pela oração. O meu segredo é muito simples: rezo. Pela oração, uno-me a Cristo pelo amor. Compreendi que rezar-Lhe é amá-Lo. […]


As pessoas têm fome da Palavra de Deus que traz a paz, traz a união, traz a alegria. Mas não podemos dar o que não temos. É por isso que devemos aprofundar a nossa vida de oração. Sê sincero nas tuas orações. A sinceridade é a humildade e a humildade só se adquire aceitando as humilhações. Tudo o que foi dito sobre a humildade não chega para ta ensinar. Tudo o que leste sobre a humildade não chega para ta ensinar. Só se aprende a humildade aceitando as humilhações, e encontrarás humilhações ao longo de toda a tua vida. A maior das humilhações é saber que não somos nada; eis o que aprendemos quando nos encontramos frente a Deus na oração.


Por vezes, um olhar profundo e fervoroso para Cristo constitui a melhor das orações: olho-O e Ele olha-me. Neste face a face com Deus, só sabemos que não somos nada e que não temos nada.






terça-feira, 11 de março de 2014

UM POUCO DE JEREMY TAYLOR (1613-1667)


 

Sobre Deus, Seu Amor, Sua Misericórdia e Sua Presença

 


“Deus, nosso Pai. Eu creio que há um Deus, que é um só, verdadeiro, supremo e o único infinitamente sábio, justo, bom, livre, eterno, imenso e bendito, em quem somente devemos colocar nossa confiança. Eu creio que Ele é o Pai de nosso Senhor Jesus Cristo e de todos os que crêem nEle, os que Ele gerou por Sua Palavra e adotou para terem herança como filhos. Porque Ele é o nosso Pai, Ele nos fará todo o bem para o qual fomos criados e destinados pela graça. Porque Ele é Todo Poderoso, Ele é capaz de realizar isso e, portanto, nós podemos crer seguramente nEle e depender dEle.


 
         Seu Amor. Todo o bem que recebemos provém do amor de Deus por nós e todo o bem que podemos desejar é efeito do Seu amor e só pode sobrevir àqueles que O amam. É por Seu amor que recebemos o Santo Jesus; é por Seu amor que recebemos o Santo Espírito; é por Seu amor que sentimos paz e alegria em nosso espírito e é por Seu amor que recebemos o mistério do sacramento. E o que pode ser maior do que o fato de recebermos por Sua bondade e amor Jesus Cristo, o Espírito Santo, a adoção, a herança de filhos, a co-herança com Jesus, o perdão dos nossos pecados, a natureza divina, a graça da preservação e da santificação, o descanso e paz interior e uma segura expectativa de glória?

 
         Sua Misericórdia. A misericórdia de Deus está acima de todas as Suas obras e acima das nossas. Ela é maior do que a criação e maior do que os nossos pecados. Como Sua majestade, assim é Sua misericórdia: sem medidas e sem regras, assentada nos céus e enchendo todo o mundo, convocando ao serviço para que Ele possa abençoar, criando o homem para salvá-lo, punindo-o para preservá-lo. A justiça de Deus se curvou diante de Sua misericórdia, Sua onisciência se converteu em cuidado e Sua vigilância em providência e atenção em socorro do homem.

 
         Sua Presença. Deus está presente em todo lugar pelo Seu poder. Ele rege as órbitas celestes com Sua mão; Ele fixa a terra com Seus pés; Ele guia todas as criaturas com Seus olhos e lhes dá refrigério com Sua influência. Deus está especialmente presente nos corações de Seu povo pelo Seu Espírito Santo. De fato, os corações dos homens são templos na realidade das coisas e, como tipo e em sombras, eles são o próprio céu, pois Deus reina nos corações de Seus servos e aí é o Seu reino. O poder da graça subjugou todos os Seus inimigos: eis aí o Seu poder. Eles O servem dia e noite, e dão graças e louvam: essa é a Sua glória. Tal é o serviço e adoração de Deus no templo.

 
         O templo é verdadeiramente o coração do homem; Cristo é o sumo sacerdote que de lá faz subir o incenso das orações, se une a elas com Sua própria intercessão e apresenta todas juntamente ao Seu Pai. O Espírito Santo, por Sua habitação no coração, também o consagra como um templo. E Deus habita em nossos corações pela fé, e Cristo pelo Seu Espírito, e o Espírito por Sua purificação, de modo que somos também habitação da misteriosa Trindade. E o que é essa amostra do próprio céu, senão o mesmo que a infância é em relação à maturidade e as letras em relação às palavras? É o mesmo estado de vida, mas não a mesma idade. É o céu visto através de um espelho, obscurecido, mas ainda assim verdadeiro, representando as belezas da alma, as graças de Deus e as imagens de Sua glória eterna pela realidade de uma presença especial.”

 

In “The very thought of Thee” org. por Steere, D. V. e Batten, J. M.

Tradução: Fernando Sabóia Vieira

 

 

terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Juliana de Norwich - Ajuda minha pouca fé

Juliana de Norwich (1342-depois de 1416), mística inglesa

Revelações do amor divino, cap. 11

«Ajuda a minha pouca fé»


Em verdade, eu percebi que tudo é obra de Deus, por mais pequeno que seja; que nada acontece por acaso, que tudo é ordenado pela sabedoria previdente de Deus. O facto de o homem ver nisso a sorte ou o acaso deve-se à nossa cegueira ou vista curta. As coisas que Deus, na sua sabedoria, previu desde toda a eternidade e que conduz de forma perfeita, incessante e gloriosamente até ao seu melhor fim, acontecem para nós de forma inesperada, e dizemos, na nossa cegueira e vista curta, que acontecem por acaso ou por acidente. Mas não é assim aos olhos do Senhor Deus. Devemos, por conseguinte, reconhecer que tudo o que é feito é bem feito, dado que é Deus que faz tudo. […]Mais tarde, Deus mostrou-me o pecado na sua nudez, bem como a forma como opera a sua misericórdia e a sua graça. […]


Vi perfeitamente que Deus nunca altera os seus desígnios, sejam eles quais forem, e que não os alterará por toda a eternidade. Não há nada que, na sua perfeita disposição das coisas, Ele não conheça desde toda a eternidade. […] Nada faltará nesse aspecto, porque foi na plenitude da sua bondade que Ele tudo criou. É por isso que a Santíssima Trindade nunca está plenamente satisfeita com as suas obras. Deus mostrou-mo para minha grande felicidade: «Olha! Sou Deus. Olha! Estou em todas as coisas. Olha! Faço todas as coisas! Olha! Nunca retiro a minha mão das minhas obras, e nunca a retirarei pelos séculos dos séculos. Olha! Conduzo todas as coisas até ao fim que lhes atribuí desde toda a eternidade, com o mesmo poder, a mesma sabedoria, o mesmo amor que quando te criei. O que poderá correr mal?»





terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

Poema de Dietrich Bonhoeffer - Estrada para a Liberdade


Estações da Estrada Rumo à Liberdade

Dietrich Bonhoeffer (1906-1945)

 

Escrito por Bohoeffer na Prisão de Tegel, em Berlin, em 1944, aproximadamente um ano antes de ser executado pelos nazistas como traidor.

Bonhoeffer foi teólogo e pastor na Alemanha na primeira metade do século XX. Integrou a Igreja Confessante, movimento cristão de oposição ao nazismo, e dirigiu um seminário clandestino de formação de líderes. Foi perseguido, proibido de pregar e finalmente preso e condenado à morte.

Da experiência de convivência com o grupo de discípulos escreveu “Vida em Comunhão” e na prisão concluiu o seu livro mais conhecido, “O Custo do Discipulado”.

 

 

Disciplina

 

Se você se dispuser a procurar a liberdade

         Aprenda, acima de tudo, a disciplina, para que suas paixões

         E seus membros não o levem confusamente

         Para trás e para adiante.

Puros sejam seu espírito e seu corpo,

         Sujeitos a sua vontade e obedientes

         Para buscar o alvo para eles proposto.

Ninguém descobre o segredo da liberdade

         A não ser por meio do domínio próprio.

 

 

Ação

 

Ouse fazer o que é justo, e não o que for conveniente;

Não perca tempo com o que pode ser,

         Mas apegue-se valentemente ao que é real.

O mundo do pensamento é fuga;

         A liberdade só vem pela ação.

Caminhe para além da espera ansiosa

         E penetre na tempestade de acontecimentos,

         Conduzido apenas pelo mandamento de Deus

         E por sua fé;

         Então a liberdade clamará exultantemente

         Para dar boas vindas ao seu espírito.

 

 

Sofrimento

 

Tremenda transformação. Suas mãos fortes e ativas

         Estão agora amarradas. Impotente, sozinho,

         Você vê o fim de sua ação.

Ainda assim, você respira fundo e deposita

         Sua luta por justiça, tranquila e confiantemente,

         Em uma mão mais poderosa.

Apenas por um suave momento, você experimentou

         A doçura da liberdade, e depois a entregou a Deus,

         Para que Ele a torne plena.

 

 

 

Morte

 

Venha, agora, momento mais elevado

         Na estrada da liberdade!

Morte, rompa as poderosas cadeias e destrua

         As muralhas de nossas almas cegas,

         Para que possamos, finalmente, ver

         O que a mortalidade nunca nos permitiu enxergar!

Liberdade, quão longamente a buscamos

         Por meio da disciplina, da ação e do sofrimento!

Agora, ao morrer, contemplamos sua a face

         No semblante de Deus.

 

         Dietrich Bonhoeffer

 

 

Sobre Dietrich Bonhoeffer escreveu um de seus companheiros de prisão, o Capitão britânico Pyne Best, ateu: “ele era todo humildade e doçura; ele sempre parecia difundir uma atmosfera de felicidade, de alegria em cada pequeno acontecimento da vida, e uma profunda gratidão por apenas estar vivo. Ele foi um dos pouquíssimos homens que conheci para quem seu Deus era real e estava sempre perto dele”.

O médico do campo de concentração que testemunhou sua  morte escreveu: “ em quase cinquenta anos de medicina, nunca vi homem morrer tão inteiramente submisso à vontade de Deus”.

Fernando Sabóia Vieira
Fonte: Radical Integrity, publicado por Barbour Publishing, Inc. Usado com permissão. Poema traduzido por Fernando

sábado, 18 de janeiro de 2014

Jesus nos chama ao serviço do Reino




Leituras bíblicas:


João 15:1-17

                   Unidos ao Senhor e uns aos outros, como ramos de uma videira, somos alimentados pela seiva vital que flui da raiz pelo troco comum. Permanecer nEle é também permanecer totalmente ligados uns aos outros. Se vivermos desse modo, frutificaremos e seremos seus discípulos e seus amigos.


Efésios 4:1 a 5:2

                   A experiência comum da fé, do batismo, do senhorio de Jesus, da paternidade de Deus e da vida no Espírito nos une, nos torna um só corpo, no qual a diversidade de membros coopera, por meio das juntas e ligamentos, para o propósito único do amadurecimento, crescimento e aperfeiçoamento de cada um no serviço do reino.


1ª de Pedro 4:10-11

                   Dons são ferramentas para o serviço. A multiforme graça do Senhor equipa a igreja com múltiplas capacitações, que devem ser utilizadas no serviço uns aos outros.


Gálatas 5:13-15

                   Nossa liberdade em Cristo, para ser verdadeira, deve produzir amor e serviço, jamais a busca dos próprios interesses e do conforto pessoal. O amor a nós mesmos escraviza a nós e aos outros, a quem queremos fazer servos de nossas vontades. O amor a Jesus nos liberta a nós e aos outros, a quem nos oferecemos livremente como servos para fazer a vontade do Pai.


Romanos 12:1-21

                   Nossa completa consagração a Deus nos levará a uma renovação de entendimento e compreenderemos que estamos unidos a Ele para uma vida comum de amor, de serviço e de proclamação.


Irmãos queridos,


Nossa vida em Jesus está absolutamente ligada ao serviço. Não é possível viver em imitação ao Senhor, seguindo Seu exemplo e em obediência a Sua palavra, sem que isso se mostre concretamente como uma vida de serviço a Deus, aos irmãos e aos homens, pois o “filho do homem não veio para ser servido, mas para servir, e dar a sua em resgate por muitos”.
Fomos chamados para servir. A proclamação do Reino de Deus não é um convite à aceitação de verdades abstratas, de uma ética ou doutrina puramente místicas, mas uma convocação a uma completa mudança de vida, a uma transformação de mente e de comportamento, reflexos diretos e necessários da nossa submissão ao senhorio de Jesus e da ação do Espírito Santo. Discípulos são servos. Eles têm uma missão, uma tarefa, um propósito que define e orienta sua existência neste mundo a partir de seu encontro com Jesus. Quando essa característica não é desde logo perceptível na vida de alguém, pode-se questionar a presença do Mestre naquela pessoa.
Pertencer à igreja implica servir. A essência do nosso vínculo como irmãos é o amor, e amar como Jesus amou significa servir como Jesus serviu. De outro modo, faremos da comunhão cristã uma mera associação humana baseada em sentimentos e preferências. Quando o serviço desaparece da vida da igreja, já não podemos ver nela a vida de Jesus fluindo, não haverá a ligação íntima com Ele que sempre produz fruto, não haverá discípulos verdadeiros, mas ramos sem ligação com a raiz da videira, que secarão e serão lançados fora.
O mesmo ocorre quando o serviço é apenas o cumprimento formal de tarefas organizacionais: não encontramos o coração do Mestre, o Seu Espírito inspirando, capacitando, vivificando, transformando pessoas e destinos, apenas uma estrutura em movimentação a custa de esforços meramente humanos.
Somos servos uns dos outros, somos responsáveis uns pelos outros e devedores uns dos outros do amor de Jesus e da nossa justa cooperação no serviço do reino. Temos que ter consciência de que pertencemos uns aos outros.
Cuidado, irmãos. Não deixemos o mundo nos constranger com seus próprios padrões e valores. Renovemos nossas mentes transformando nosso entendimento. O espírito da maldição de Caim é máxima de sabedoria de vida nesta nossa geração: “acaso sou eu guardador de meu irmão?” Vale dizer, “cada um que cuide de sua própria vida. Eu cuidarei apenas de mim mesmo!”
Nossa responsabilidade com o serviço da igreja e com os irmãos tem expressão concreta e prática no nosso compromisso com os encontros, nos vários níveis de relacionamento e de integração. No Corpo de Cristo não há expectadores, mas apenas participantes. Sempre que nos encontramos, quer nos momentos informais, quer nas reuniões programadas, expressamos nosso vínculo e comunhão em Cristo, Sua Presença se torna viva e perceptível e o serviço deve ser uma conseqüência natural disso.
Quando os encontros e reuniões com os irmãos perdem a característica de serviço, de ministração mútua, de uso coletivo dos dons em favor de todos, tornam-se rituais pobres e sem poder, compromissos sociais enfadonhos e sem alegria. Perdem seu significado e relevância.
De modo especial, nosso compromisso com os irmãos a quem estamos mais proximamente vinculados é essencial para que a igreja cresça saudável e frutífera.
O crescimento saudável da igreja depende do compromisso e do serviço de cada um, na edificação dos irmãos e na proclamação do reino de Deus.
De igual modo, o crescimento saudável de cada um depende de sua própria participação comprometida no Corpo, pelos vínculos e relacionamentos que são os canais pelos quais receberá o alimento e a instrução de todos.
O serviço dá sentido concreto, natural, prático às nossas vidas espirituais. Sem ele, corremos o risco de nos iludirmos com uma espiritualidade desencarnada, puramente teórica, desobediente ao Senhor que se fez carne e viveu uma vida a serviço dos outros.
Por outro lado, o serviço dá sentido transcendente, eterno, às nossas vidas naturais e terrenas, livrando-nos de viver de modo fútil, voltados apenas para bens e alvos transitórios. Quando servimos ao Senhor e aos homens em Seu nome, mantemos a perspectiva do reino e propósito imutáveis de Deus, do sentido de nossa peregrinação em direção às moradas espirituais do Pai celeste.
Servir fortalece a comunhão com Deus, forma o caráter, retira o ego do centro da vida, exercita a autonegação, a humildade, a paciência e todas as virtudes do Mestre.
De especial valor é que a consciência de sermos servos nos mantém afastados da tentação do sucesso e da frustração do fracasso em projetos deste mundo, duas fontes de ansiedade e de enfermidade dos homens modernos.
Todas as vezes que nos afastamos do amor e do serviço aos outros, que nossas carências e necessidades nos parecem tão graves e urgentes, que nossos desejos e sonhos ocupam completamente nosso coração e nossa agenda conosco mesmos, já deixamos de seguir o Mestre, estamos andando em caminhos em que Ele não está e, ironicamente, nos afastando da única maneira de viver que pode nos fazer pessoas plenas, realizadas e felizes: a experiência do amor de Deus, nosso Pai.
Servir aperfeiçoa os dons, habilita para a obra e para a vida, dá experiências com o Senhor, nos coloca na constante dependência dEle. Mantém no coração a consciência da Presença de Jesus, a quem servimos quando servimos aos homens.
Sempre que pedimos dons, o Senhor nos apontará as pessoas a nossa volta, irmãos e incrédulos e nos perguntará se estamos dispostos a sermos servos deles, por amor.
O serviço é a encarnação do amor de Deus. Assim foi na vida de Jesus, assim deve ser na vida de seus discípulos. No derradeiro diálogo do Senhor com Pedro registrado nas Escrituras, o Mestre nos incluiu a todos quantos queremos ir após Ele quando vinculou nosso amor a Ele ao serviço dos irmãos, ao cuidado com o Seu rebanho.
Só o serviço nos coloca e nos mantém num correto uso dos bens e recursos materiais, porque nos deixa sempre na condição de mordomos, e não de donos. Quando servimos como nossos bens e recursos reconhecemos e demonstramos que não são de fato nossos, mas do Senhor, que nos são confiados para o Seu propósito. Quando com eles não servimos, roubamos do Senhor aquilo que a Ele pertence.
O verdadeiro discípulo recebe humildemente o serviço de seus conservos como graça do Senhor em sua vida. Sabe que necessita que outros lhe lavem os pés, o edifiquem, consolem e corrijam, que não é, de modo algum, capaz de viver sozinho e de prover as próprias necessidades.
Uma característica fundamental do servo de Deus é que ele busca sempre a glória do Seu Senhor, jamais a sua própria. Assim, o servo aceita e mesmo prefere o anonimato, porque não visa agradar aos homens e deles receber qualquer tipo de reconhecimento ou recompensa, nem agradar a si mesmo, enchendo-se de orgulho pelo desempenho pessoal, mas visa agradar unicamente Aquele a quem ama de todo coração, de toda alma, de todo entendimento e de toda força.
Por isso, servos de Jesus não murmuram, não reclamam, não julgam, mas adoram, celebram, cantam, louvam durante a tarefa, quanto mais quanto mais dura e custosa. Servir, não por acaso, é uma das raízes bíblicas para a palavra “adorar”.
Finalmente, o serviço é o caminho privilegiado para a amizade de Jesus: o Senhor escolhe Seus amigos dentre seus servos, ou melhor, faz amigos entre os discípulos que aprendem com Ele a servir, pois o serviço nos revela o coração de Deus, nos coloca em contato direto com Seu propósito, com as pessoas que Ele ama e a quem quer salvar.
Em suma:
A tarefa – proclamar o reino, fazer discípulos, edificar a igreja, amar ao Senhor, aos irmãos e aos homens, fazer o bem a todos, socorrer, consolar, libertar, curar, numa palavra, imitar a vida de serviço de Jesus.
O tempo: hoje, os campos estão prontos para a colheita, o Senhor em breve virá, o mundo agoniza no pecado e nas trevas, não sabemos o dia e a hora em que estaremos diante dEle para dar conta dos talentos que Ele nos confiou.
Os recursos: A vida de Jesus em nós, o poder do Seu Espírito, os dons, tudo quanto Ele nos tem dado de meios e talentos.
A estratégia: a Palavra, os relacionamentos, o funcionamento do Corpo, anunciar o reino a todos, orar por todos, servir a todos.
Os chamados ao serviço: eu e você.

         Brasília, em outubro de 2010, aD.
         Fernando Sabóia Vieira