Possíveis Olhares
Brasília, DF, em fevereiro
de 2020, AD.
Queridos companheiros de
jornada em busca da vida interior,
Há
alguns anos, publiquei neste espaço virtual, uma “Crônica dos Possíveis Olhares”, onde propunha uma meditação sobre
as palavras de Jesus no Sermão do Monte pelas quais Ele nos exorta a adotar uma
maneira diferente de ver a realidade à nossa volta.
O texto
está em
Nesses
dias, essa reflexão foi retomada na nossa comunidade em razão de experiências
vividas por vários irmãos no ano passado, envolvendo circunstâncias diversas e
mesmo intensos períodos de dificuldades e provações.
Consideramos
os seguintes textos do Evangelho de Mateus.
·
Mateus 5:8 – os puros de coração verão a Deus.
·
Mateus 6:22-23 – os olhos são as lâmpadas do corpo.
·
Mateus 6:26, 28 – é necessário olhar e ver como o Pai cuida de tudo.
Jesus nos
convida a percebermos de modo diferente as circunstâncias da vida, as necessidades
e os temores cotidianos que nos enchem de ansiedade. Ele nos leva a enxergar
nas cenas e experiências normais e comuns do nosso viver – as aves dos céus, as
flores silvestres – o cuidado do nosso Pai celeste e a, desse modo, encontrarmos
confiança, esperança e descanso em Sua divina Providência, como Seus filhos.
Mas,
devemos nos perguntar: o que nos impede, muitas vezes, de ver a Deus, de
perceber Sua Presença, Sua misericórdia, Seu amor e Providência ao nosso redor
e nas circunstâncias de nossa vida? O que nos atrapalha discernir a Realidade divina
que envolve todas as coisas, visíveis e invisíveis, e abrange todos os aspectos
de nossa existência?
O Senhor
nos diz que, para termos essa revelação, são necessárias a pureza no olhar e a
pureza no coração, unindo-se a percepção física exterior à compreensão
interior.
Para onde
e como devemos olhar? Isto é, em que devemos focar nossa atenção, pensamento, sentimento
e cogitações? Gosto das expressões do salmista quando diz: “Tu, Senhor, lanças
luz nas minhas trevas” (Salmo 18:28); e “Na tua
luz vemos a luz”(Salmo 36:9).
Precisamos
buscar essa iluminação, essa pureza no olhar, na meditação na Palavra do
Senhor, na atuação reveladora do Espírito no nosso espírito, na consideração de
Seus poderosos feitos, na experiência de Sua misericórdia, na contemplação de
Sua Face.
Mas,
para, de fato, vermos a Realidade divina, é preciso cuidar da maneira como
essas percepções são acolhidas no nosso coração. Nosso coração está em busca da
pureza de fé, de intenção, de vontade e de amor ao Senhor? Ou está ele confuso
e cheio de ideias e sentimentos conflitantes, de desejos, temores e fantasias,
frutos de nossa própria alma?
O que
atrai nossos olhares? O que nos turva o coração?
Em sua
primeira Epístola, o apóstolo João nos adverte quanto aos nossos amores confusos,
mesclados de mundo, que querem capturar nosso olhar e o nosso coração (1ª de João 2:15-17).
Não
podemos nos colocar naquela situação dos que, mesmo vendo com os olhos, não acolhem
com o coração, tornando-se, assim, cegos de visão e faltos de entendimento .
São
nossos olhares dirigidos pela confusão do nosso coração, por nossa cobiça, medo,
sonhos, conceitos, temores, fantasias etc., ou são nossos olhares atraídos pelo
amor de Deus e dirigidos para o amar a Deus?
Afinal, o
que é essa pureza de coração que nos permite ver a Deus? Em verdade, Deus só
pode ser claramente visto por quem deseja e busca amar unicamente a Ele, para
n'Ele, ter e amar todas as coisas!
Deus
trabalha ativa e constantemente para purificar nosso coração e conquistar nosso
integral amor a Ele. Ele quer nos purificar de nossos conceitos, ideias,
limitações e nos trazer revelação da verdade, da eternidade, da perfeição. No entanto
para, isso, torna-se necessário, não raro, passarmos por provações (Tiago 1:2-4).
Perguntamos,
pois, novamente: como você vê a Realidade à sua volta? O que o seu coração diz
sobre ela? Como você percebe as circunstâncias de sua vida, favoráveis ou
adversas? Como elas repercutem no seu coração?
Trazemos
aqui dois testemunhos, de duas jovens discípulas que enxergaram com olhos bons circunstâncias
muito diferentes, e assim trouxeram luz para seus corações, os quais, uma vez
purificados por sua fé, atenção e perseverança em amar a Deus, permitiram que
elas tivessem uma revelação mais clara e intensa do Pai de sua glória e de Seu
amor.
Júlia nos
lembra da necessidade de vermos todas as coisas sob a perspectiva da eternidade,
para considerarmos seu real sentido e valor. Seu testemunho está disponível em
Viviane nos
traz um emocionante testemunho sobre enfrentar a dor e a enfermidade e enxergar,
nessas difíceis circunstâncias, a Presença e o amor de Deus. Leiam em
Finalmente, sobre a
pureza de coração, uma declaração, em forma de oração, de um notável filósofo e
pensador cristão.
Pureza de Coração é Desejar uma Única Coisa
Pai, que estás nos céus! O que somos nós sem Ti? O que é todo o nosso conhecimento, por mais que o acumulemos, a não ser um pequeno fragmento, se não conhecemos a Ti? O que são todos os nossos esforços, ainda que abarquem um mundo inteiro, a não ser um trabalho nunca terminado, se não conhecemos a Ti: o Único, Aquele que é a Única Coisa e que é todas as coisas?
Que Tu dês, então, ao intelecto, sabedoria para compreender
essa Única Coisa;
Ao coração, sinceridade para receber esse entendimento;
À vontade, a pureza que deseja uma Única Coisa.
Que, na prosperidade, Tu concedas perseverança para desejar
uma Única Coisa;
Em meio às distrações, recolhimento para desejar uma Única
Coisa;
No sofrimento, paciência para desejar uma Única Coisa.
Tu que propicias tanto o início quanto a plenitude,
Que Tu possas, logo cedo, ao nascer do dia,
Dar ao jovem a resolução de querer uma Única Coisa.
À medida que do dia declina,
Que Tu dês ao ancião uma lembrança renovada dessa primeira
resolução,
De modo que o primeiro seja como o último e o último como o
primeiro,
No decurso de uma vida que desejou uma Única Coisa.
Søren Kierkegaard (1813-1855)
In “Prayers from the Heart”, Foster,
Richard, ed. Harper/Collins.
Tradução: Fernando
Sabóia Vieira
Que a
suficiente graça de Jesus seja com o espírito de cada um de vocês.
Fernando
Saboia Vieira
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