domingo, 4 de dezembro de 2011

O Amor Cobre Todas as Transgressões

UMA CRÔNICA DE NATAL


“... mas o amor cobre todas as transgressões.”
Provérbios 10:12


        Ao longo do ano – da vida, na verdade – vamos acumulando questões de relacionamento, situações de conflito, divergências bem ou mal resolvidas. As pessoas falham conosco e nós com elas. Não são apenas mal entendidos ou incompreensões. Pecamos mesmo uns contra os outros. Transgredimos. Sofremos e causamos sofrimento, danos, dores e tristezas. Podemos mesmo ter armazenado tal quantidade de situações como essas que nos pareça muito difícil, senão impossível, superá-las.
         O Livro de Provérbios, em sua sabedoria prática, nos diz diretamente que “o ódio alimenta as contendas, mas o amor cobre todas as transgressões”.  Esse texto é citado duas vezes no Novo Testamento, uma por Pedro, no contexto do amor fraternal, e outra por Tiago, referindo-se à salvação dos pecadores.
         Mas como o amor cobre todas as transgressões?
         Penso que, em primeiro lugar, devemos dar expressão à teologia simples do Livro de Provérbios e entender que o que alimenta as contendas e desentendimentos é a disposição de coração das pessoas envolvidas. Quando é má, não há solução para os conflitos. De outro lado, se eu amo alguém, não levo em conta seus defeitos, atitudes negativas e transgressões para continuar o relacionamento e buscar fazer-lhe o bem.
         Não poderia ser que as nossas questões interpessoais não se resolvam, simplesmente, por falta de amor? Ou, pelo menos, que a perda da perspectiva prioritária e essencial da necessidade de amar dificulte qualquer solução ou caminho?
         Devemos nos lembrar de que amar, para o discípulo de Jesus, não é uma alternativa ética “superior” ou “apenas” um mandamento entre outros. Amar é a conseqüência necessária e direta do seu relacionamento com Deus, a essência desse relacionamento, sua origem, fundamento e finalidade.
         Assim, o texto de Provérbios significa que amar me leva a superar todas as transgressões, minhas e do outro, e prosseguir no relacionamento até Deus produzir por meio dele o deseja – em mim e no outro.
         Quando amo, não me faço juiz nem de mesmo nem de ninguém, não faço contabilidades, não penso em termos de vitória ou derrota, ter ou não razão, direitos ou deveres. O amor tudo supera, tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta. Não se impacienta, não está à procura de si mesmo. Fala além das palavras, se dá além dos atos. O amor enseja a visitação de Deus na historia humana, na minha história.
         Não se trata de ingenuidade piedosa. Não é um otimismo humanista. É uma compreensão profunda e essencial da Realidade, Presença e Caráter de Deus, que tudo gera, tudo sustenta, tudo inclui, tudo conduz, tudo transforma.
         O amor cobre todas as transgressões porque aponta para o amor sacrificial de Jesus, com suas demandas e conseqüências. Não é graça barata, não é desconsiderar a malignidade do pecado. Ao contrário, é reconhecer que é tão grave a ofensa que a única solução possível está na Graça de Deus, e essa solução só está disponível porque Ele amorosamente nos a concedeu.
         Os relacionamentos humanos só são possíveis e frutíferos na graça de Jesus. Ele desfez em sua carne a barreira de inimizade e nos aproximou, fazendo a paz entre os que estavam longe e os que estavam perto, como resultado de nossa paz com Deus.

         “Porque um menino nos nasceu, um filho se nos deu, o governo está sobre seus ombros e seu nome será ... Príncipe da Paz”, diz a profecia que se cumpriu no Advento de Sua Vinda.

         Mesmo quando devo anunciar o Reino de Deus ao pecador ou corrigir o irmão deve ser o amor a me conduzir, e não a noção de uma tarefa ou missão, ou minha impaciência e intolerância.
         O amor não precisa de confissões ou explicações. Não é condicional, não depende de resultados ou de reconhecimento. Apenas não pode contradizer-se a si mesmo, e continua amando, fluindo desde sua fonte eterna em Deus.
         O amor supera todas as barreiras, tanto as que me separam do “estrangeiro” quanto as que me distanciam dos “próximos” e “familiares”. Não vejo sua roupa estranha ou suja, sua aparência “marginal”, suas maneiras impróprias, seus piercings, suas tatuagens, não sinto seu hálito contaminado, não me incomoda sua prepotência e soberba, não considero sua agressividade...
Não quantifico o relacionamento, não “classifico” o irmão, não o julgo, apenas considero que Jesus está nele, está em mim e está entre nós, com Sua Graça que alcança a mim e a ele do mesmo modo ...
Cobrir as transgressões não é “resolver” os problemas, mas superar as debilidades e erros dos outros até que as questões sejam resolvidas ou até que o Senhor manifeste Sua Glória. Enquanto os mantemos evidentes, descobertos é porque não amamos incondicionalmente, e, se não amamos, não anunciamos o Reino, não trazemos a presença de Jesus, não edificamos.
Isso pode ser particularmente desafiador em relação às pessoas próximas que conhecemos bem e com quem nos relacionamentos intensamente, incrédulas ou não. Talvez sejamos especialmente rigorosos com os irmãos da fé, de quem esperamos determinadas atitudes. Com os de fora, nossa postura pode ir da repulsa à indiferença. Em ambos os casos, estará presente o julgamento, e não o amor.
Nesses dias anunciamos a Vinda de Jesus, o Príncipe da Paz, aquele que levou sobre Si as nossas transgressões. Que a contemplação de sua vida, sacrificial desde o Seu nascimento, produza em nós a experiência do Seu amor e através de nós a manifestação desse amor a todos à nossa volta!

Que a Graça de Jesus, o Emanuel, seja com todos.

Fernando Sabóia Vieira
Brasília, dezembro de 2011, AD.

        

        

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