sexta-feira, 8 de abril de 2016

Amor e perdão


Amor e perdão

 Companheiros de jornada em busca da vida interior,


         Vejam que intrigante esse Evangelho, em Lucas 7:36-50:

   “Por isso te digo: Perdoados lhe são os pecados, que são muitos; porque ela muito amou; mas aquele a quem pouco se perdoa, pouco ama. E disse a ela: Perdoados são os teus pecados.   Mas os que estavam com ele à mesa começaram a dizer entre si: Quem é este que até perdoa pecados?  Jesus, porém, disse à mulher: A tua fé te salvou; vai-te em paz.   

            A história é conhecida: Jesus é convidado por um fariseu, chamado Simão, para uma refeição em sua casa. Uma prostituta da cidade, sabendo que Ele estaria lá, entra sem convite, derrama bálsamo aos Seus pés e começa a lavá-los com lágrimas e a enxugá-los com os cabelos. A cena provoca, naturalmente, no anfitrião, repulsa e dúvidas sobre a espiritualidade do Mestre.
         Sabedor do que ia no coração de Simão, Jesus lhe propõe uma pergunta sobre perdão e amor, cuja resposta imediata é no sentido de que quem é muito perdoado, muito ama. Mas ao aplicar essa conclusão ao caso da mulher, o Senhor, aparentemente, inverte a proposição ao dizer que os muitos pecados dela eram perdoados porque ela havia muito amado.

         Afinal, é o perdão de Deus a fonte do nosso amor a Ele ou é o nosso amor a Ele a motivação para o Seu perdão dos nossos pecados? Confesso que esse texto sempre me causou perplexidade por muito tempo.
         Esses dias, porém, cheguei a uma conclusão simples. De fato, o perdão de Deus nos move a amá-lO. Ele é sempre o início e a fonte de tudo.

No caso daquela mulher o que podemos concluir é que o muito amor que ela demonstrou era uma evidência de que ela havia sido perdoada. Jesus declara o que já havia ocorrido no coração dela! Seus pecados foram perdoados quando ela creu. Ao comprar o bálsamo e entrar ousadamente em uma casa onde jamais seria recebida e tocar o Mestre como ela o fez ela expressou de maneira vívida e pungente a fé que ardia em seu coração. Quando ela creu? Não sabemos. Não nos diz o Evangelho. Mas podemos ter certeza de que ela creu e de que seus pecados foram perdoados pelo muito amor que ela demonstrou.
         Cremos termos sido perdoados pelo Senhor dos nossos pecados. Mas isso é evidente pelo amor que porventura demonstramos a Ele? A que me move a consciência desse perdão? A um conforto emocional? A uma religiosidade fundamentada apenas numa solidez doutrinária? A uma certa acomodação quanto à vida espiritual pela certeza da eternidade?

         Não foi assim com aquela mulher. Não sabemos o que a havia levado a uma vida de pecado. Podemos conjecturar que ela viva numa sociedade patriarcal, machista e preconceituosa. Qualquer mulher que se visse órfã, viúva ou repudiada pelo marido teria muitas dificuldades de sobreviver. Havia a hipocrisia dos religiosos, prontos a condenar publicamente aquelas a quem procuravam às escondidas.
         Por outro lado, talvez ela tivesse sido mesmo atraída pelos prazeres e tentações carnais e desperdiçado sua juventude e beleza numa vida dissoluta, como vemos tantos jovens de nossa própria geração fazerem.

         Há muitos e largos caminhos para longe de Deus, mas um único e estreito para perto Dele. E quando aquela mulher o encontrou não foi contida pelas convenções sociais nem embraçada pelo seu próprio pecado.
        Não precisou dizer muitas coisas ao Senhor. Não foram necessárias declarações eloquentes nem formulações doutrinárias. Sua vida foi argumento suficiente para Jesus dizer a todos os presentes que ela estava perdoada e salva pela evidência do muito amor que ela demonstrou.

         Para onde e para quem as evidências concretas do meu amor apontam? O quanto me entrego e a que ou a quem me entrego? A que ou a quem dedico meus pensamentos, meus bens, meus sentimentos, meu tempo, minha vontade, minha admiração?
         Se as pessoas observarem meu comportamento e elaborarem, com base nele, uma lista do que é importante e valioso para mim, o que elas escreverão? Se pudessem ler minha alma, o que concluiriam sobre os tesouros do meu coração?

         Devemos ter cautela, todavia, nesse tipo de aferição. Somente pode ser contado como valioso o que for autêntico, o que provier de motivação sincera, o que for resultado do encontro com o Senhor e com Sua Graça.

         Como disse Bernardo de Clairvaux, a razão suficiente do nosso amor a Deus é o próprio Deus e a medida desse amor deve ser amá-lO sem medida.
         Finalmente, lembramos Agostinho: “O homem é aquilo que ele ama. Se amamos o mundo, somos mundo. Se amamos a Deus, ousemos dizer, somos divinos.”.

         Que a grande e decisiva evidência de que fomos perdoados pelo Senhor seja nosso incontido amor a Ele, traduzido em adoração, quebrantamento, humildade, serviço e amor ao próximo.
         Companheiros, que a comovente e constrangedora Graça de Jesus seja com todos.

         Ainda na jornada,

         Fernando Saboia Vieira

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