terça-feira, 15 de junho de 2010

UM POUCO DE A. W. TOZER (1897-1963)

AS QUATRO ESTAÇÕES DA VIDA



Sermão pregado na Avenue Road Alliance Church, em Toronto, por A. W. TOZER


PRIMEIRA PARTE



Na profecia de Jeremias, capítulo oito, versos dezoito a vinte e um, o homem de Deus diz:

“Oh! Se eu pudesse consolar-me na minha tristeza! O meu coração desfalece dentro de mim.
Eis a voz do clamor da filha de meu povo de terra mui remota: Não está o Senhor em Sião? Não está nela o Rei? Por que me provocaram à ira com suas imagens de escultura, com os ídolos estrangeiros?
Passou a sega, findou o verão, e nós não estamos salvos.
Estou quebrantado pela ferida da filha do meu povo; estou de luto; o espanto se apoderou de mim.”


Jeremias é muitas vezes chamado de o profeta que chora. Ele tinha o coração partido porque a ameaça do julgamento de Deus estava sobre seu povo. Jeremias não via apenas o que era visível e não ouvia apenas o que era audível, mas ele via profeticamente pelo Espírito. Assim, não apenas tudo que havia acontecido mas também tudo o que ainda ia acontecer doía no coração desse homem. Uma invasão iria acontecer em Israel; tropas estrangeiras entrariam e conquistariam os israelitas e os levariam cativos a uma terra longínqua. Eles iriam despedaçar suas vidas e despedaçar sua nação, eis o que iriam fazer. Isso não era o resultado de um erro político. Era a conseqüência direta de sua vida maligna. Jeremias, um homem cheio do Espírito Santo, foi muito franco com os filhos de Israel.
Já me aconteceu de ouvir pregar pessoas que não tinham, a meu juízo, o direito de falar aos outros sobre os seus pecados. Elas o faziam com excesso de entusiasmo e carência de ternura. Mas Jeremias disse “Estou ferido das feridas da filha de meu povo”. Jeremias era um homem ferido e ele estava ferido não por coisas que lhe tocavam diretamente. Ele estava ferido como estaria ferida uma mãe cujo seu filho morresse em seus braços. Ela, fisicamente, não tem nenhum ferimento. A criança foi atingida, ela a recolhe e, num paroxismo de dor, ela a aperta contra eu coração. Ela está ferida da ferida de seu filho.
Jeremias estava ferido da ferida de seu povo e, portanto, Jeremias pode me falar, ele pode me falar com tanta severidade quanto for necessária; ele pode ser franco como a situação exige, eu não o rejeitarei, porque um homem que é ferido das minhas feridas, que sofre as minhas dores, que se entristece com a minha tristeza é um homem que me ama. E um homem que me ama tem o direito de pregar para mim. E eu não lhe pedirei que me console ou que me fale amigavelmente ou gentilmente. Eu pedirei a ele, simplesmente, que me fale a verdade.
Jeremias sabia que eram os pecados do povo de Israel que iriam causar os eventos que viriam, a derrota, a divisão, a invasão, o cativeiro, a deportação. Ele o sabia e ele apontou para eles os seus pecados: ele advertiu que havia idolatria. Javé estava no meio deles mas em seus corações perversos eles se desviaram do Deus que eles conheciam para irem após os ídolos do pagãos.
Eles eram desonestos uns com os outros – eu não estou inventando nada, está tudo escrito – eles eram mentirosos, não hesitavam em mentir mesmo sabendo que isso era mal. Havia ladrões entre eles; eles cometiam até mesmo homicídios, às vezes. Entre eles havia toda espécie de impureza. Havia a arrogante desobediência à voz de Deus. Eles eram obstinados quando ouviam a voz de Deus e recusavam a correção. Jeremias ouviu profeticamente esse grito de desolação: “a colheita passou, o verão terminou – o verão de nossa oportunidade passou – e nós não estamos salvos!”. Nós estamos longe, numa terra pagã, com nossas harpas penduradas nos salgueiros.
Num país longínquo, eles prefeririam a morte à vida, disse o homem de Deus. Lá, no cativeiro, numa terra distante, sem oferendas, sem sacerdotes, sem altar, sem orações, sem proteção, sem nada... Na Babilônia eles não teriam senão lembranças amargas, remorsos, lamentos inúteis. O profundo abatimento da alma perdida se ouviria nesse grito: “a colheita passou, o verão terminou, e nós não estamos salvos!”. É o apelo desesperado por ajuda. Eles viveriam, no país remoto, as conseqüências amargas, mas previsíveis, de seu estilo de vida, de seus atos.
Vejam, meus amigos, se um homem sabe que uma ponte caiu, se há placas e placas para avisar que a ponte caiu, e se ao longo da rodovia há policiais fazendo sinais de mão com suas bandeiras vermelhas e gritando “Atenção, a ponte caiu!” e se um homem prossegue seu caminho, deliberadamente, com um sorriso nos lábios, e depois se precipita para a morte, ele poderia ter previsto isso, porque tudo estava lá para preveni-lo.
Saibam, meus amigos, que ninguém está no inferno por acidente, e ninguém está no paraíso por acidente.
Tornar-se cristão sem querer, isso é impossível. Ninguém acorda de manhã e constata, com surpresa, que ficou famoso; e, do mesmo modo, ninguém pode acordar numa bela manhã e descobrir, sem mais nem menos, que virou cristão. Isso se escolhe, se prevê. Pode-se sabê-lo, com a palavra de Deus.

Nós sabemos que dois mais dois são quatro e, então, se nós vemos dois mais dois podemos prever o quatro. Assim, Israel, no seu grito de remorso, de intenso lamento, poderia tê-lo previsto. O caminho que eles tomavam estava claramente sinalizado e eles poderiam tê-lo evitado.
Gostaria de deixar clara uma coisa aqui: o tipo de cristianismo que se prega hoje é um cristianismo fraco, indeciso, efeminado! Ele diz ao pecador que não é culpa dele, que é uma doença.
Hoje em dia, se diz que o alcoolismo é uma doença e que o alcoólatra é um homem doente. É a única doença que eu conheço no mundo que alguém tem que adquirir com dinheiro. Tem comprar e beber, voluntariamente. Mas dizem: “Não diga ao bêbado que ele é culpável, ele é doente”; de uma doença que ele bebeu intencionalmente sabendo quais seriam as conseqüências disso! Ele poderia tê-la previsto e tê-la evitado. O homem no inferno terá que acrescentar ao peso de sua desgraça eterna o de saber que ele poderia estar num lugar diferente; se seu amor pelo pecado não o tivesse impedido de querer estar em outro lugar. Essa é a ironia cínica do pecado.
Vocês percebem, as pessoas não se dão mais conta da gravidade do pecado nos dias de hoje. O evangelista moderno não fala mais nisso. Ele fala muito de um salvador choraminguento, que os desculpa e diz: “Não se preocupe com seus pecados, não se preocupe com seus pecados, eu morri por você na cruz”. Essa não é a religião do Novo Testamento! Essa não é a religião dos profetas, essa não é a religião dos pais da igreja, essa não é a religião dos reformadores, essa não é a religião dos missionários e nem a religião dos grandes evangelistas.
É um cristianismo efeminado, esculpido em água e perfumado, que apresenta um Cristo digno de pena diante de pessoas que zombam dele. Eu ouvi um homem dizer que passamos nosso tempo a alimentar pessoas que não querem comer. O que deveríamos dizer às pessoas é que os seus pecados são culpa delas. Vocês, se vocês pecarem é culpa de vocês. E eu, se eu pecar, eu sou responsável. Não é uma desculpa dizer que “é uma doença”, ou que “eu não fiz de propósito, é hereditário, eu herdei de meu avô Adão; não pude fazer nada, eu sou um pobre homem, fraco.”
A ironia cínica do pecado é que aqueles que nos dão respaldo no pecado não podem mais nos ajudar quando sofremos suas conseqüências. Eles nos colocam as mãos sobre os olhos para nos impedirem de ver que o carrasco se aproxima, para que não enxerguemos o buraco negro na colina que conduz ao inferno.
Os maus amigos – os maus desejos e paixões terrenas, os maus prazeres – nos impedem de obedecer, nos afastam do caminho reto, mas, quando estamos longe, eles não podem nos impedir de sofrer suas conseqüências. É a apavorante crueldade do dragão. Uma traição impiedosa da confiança do pecador.


Judas Iscariodes foi lisonjeado e bajulado pelos judeus até ter vendido Cristo. No entanto, uma vez que eles haviam lançado as mãos sobre Jesus, e o haviam amarrado em cordas e o manietado, e Judas com o coração quebrado veio lhes devolver o dinheiro, esses mesmos fariseus, hipócritas e bajuladores, que lhe haviam suplicado que vendesse Jesus lhe oferecendo ouro e prata, esses mesmos judeus responderam: “Que nos importa? Isso é problema seu”. “Que nos importa?”.
Lembre-se, mocinha, “Que nos importa?” será a resposta se você pecar! Lembre-se rapaz, aqueles que levam você ao pecado não poderão tirar você de lá. E esses que para lá levam você, lhe dirão, quando você estiver lá: “Que nos importa?”. É a cínica maldade do inferno – e aí eu sinto o hálito do dragão!
O que podemos, então, concluir de tudo isso? Essa é uma descrição exata de um bom número de pessoas hoje, e também, suponho, de alguns que estão entre nós aqui, hoje. Domingo passado, eu disse ao irmão Gray que havia cinqüenta pessoas, algumas que cantavam, outras no coral e talvez mesmo ensinando na escola dominical, que deveriam estar lá, de joelhos, se nós houvéssemos obedecido a Deus no domingo passado, pois o Espírito Santo estava presente.
Não estou criticando os que ensinam na escola dominical, mas apenas estou dizendo que em qualquer ajuntamento de pessoas atacadas pelo fogo do inferno há feridos, há os vencidos pela carne, pelo mundo e pelo diabo. Isso, como eu disse, é uma descrição precisa. Há alguns que sabem que o caminho que estão trilhando leva à perdição. Foram sem dúvida advertidos e exortados, mas se fizeram voluntariamente cegos quanto ao desfecho.
No entanto, eu pessoalmente, não quero que jamais Deus me diga “Eu te dei a oportunidade de dizer a essas pessoas, mas você não o fez, você preferiu ser simpático, você quis ser amado por elas, e você se recusou a adverti-las”. Eu não quero ouvir essas palavras terríveis naquele dia. Prefiro perder todos os meus amigos a ouvi-las. Eu preferiria que todos vocês me dessem as costas e partissem friamente encolerizados a viver esse momento apavorante onde os gritos dos homens e das mulheres ressoarão: “O verão passou, a colheita terminou”, sabendo que eu não ajudei a socorrê-los, não ganhei suas almas levando-os a Deus. Ainda não é tarde demais. Não é importante que as pessoas me achem simpático, o que importa é que vocês sejam lavados com o sangue do Cordeiro, antes que seja tarde demais. Não é importante que vocês me achem simpático, mas é muito importante que vocês se reencontrem com Deus, um reencontro que os salvará antes do terrível dia no qual vocês seriam obrigados a gritar “Eu deixar passar a oportunidade”. (A continuar)

“Les Quatres Saisons de la Vie” (www.eglisedemaison.com/livres/tozer)
Tradução: Fernando Sabóia Vieira

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