segunda-feira, 28 de setembro de 2015

No princípio


 

No princípio

De éramos nós dois

Se faziam tardes e manhãs

E sete anos de pastor servia

Contava a lenda que dormia

E havia chamas eternas

Que ardiam sem sentir

E todas as coisas eram belas

Não existia o porvir

 

Depois, fizeram-se os filhos

Umas criaturinhas engraçadas

Sem tardes nem manhãs

Sem botão de desligar

E tudo se recriou

As palavras e os brinquedos

A vida e seus segredos

E ainda éramos nós dois

A sonhar com o que viria depois

 

E ainda as fadigas

As lutas da vida

E ainda os dias de caminhar

As noites de descansar

E ainda o caos e a poesia

A paz e a fantasia

 

Agora sabemos que sempre será

O princípio

E o começo de nós dois

Assim antes como depois

Ainda que os anos passem

E levem céus e terras antigas

E venham as novas cantigas

 

Porque o Deus que tudo fez

Tudo ainda faz e fará

E no Reino que Ele criou

As princesas nunca envelhecem

E as músicas não terminam

Os amores nunca se esquecem

E as cores jamais fenecem

 

 

Fernando

Para Sandra.

Setembro de 2015, 30 anos.

 

 

 

 

 

 

 

 

Soneto de Reencontro


                           Para Sandra
 
 
Quero te ver diferente

Para te amar como sempre

Quero te ver como sempre

Para te amar diferente

 

Faz tempo que não te invento

E você fica, assim, desinventada

Porque só meu amor te retraduz

Com prazer, com cor e com luz

 

Sei que você não me via mais

Porque desapareci, me confundi

Nas coisas e nas horas banais

 

Mas agora de novo me compreendi

No sentido do nosso viver fugaz

Nas certezas suaves dessa nossa paz

 

Fernando Sabóia

 

 

segunda-feira, 14 de setembro de 2015

A Divina Tragicomédia da Fé Humana


A Divina Tragicomédia da Fé Humana

     Para Mayara, um novo sentido para suas marcas...

 

Deus me faz rir,

Deus me faz chorar.

Deus me faz esquecer,

Deus me faz lembrar.

 

Quando eu me lembro

Dos meus pecados

E do meu tempo perdido

E me perco e choro,

Deus me acha e se esquece

Das minhas lembranças tristes

E eu não posso mais me lembrar

Daquilo de que Deus já se esqueceu

E, então, eu rio do meu choro esquecido.

 

Quando eu me esqueço

Da maravilha da existência

Da beleza dos céus e da Terra

E do dom precioso da vida

E me abandono cabisbaixo à tristeza

Deus sobre mim levanta

O Seu Rosto resplandecente

E tudo em mim brilha e sorri

E eu choro de êxtase e de alegria.
 

Quando eu choro

Minhas perdas, danos e dores,

Ele me conta a história sem fim

Da Sua Graça na minha vida

E minhas lágrimas tristes

Desaparecem afogadas nas ondas

De um imenso mar de lágrimas de alegria.

 

A alegria de Deus

É minha celebração,

A tristeza de Deus

É minha salvação.

 

O esquecer de deus

É minha liberdade,

O lembrar de Deus

É minha eternidade.

 

Fernando Sabóia Vieira, entre risos e lágrimas, set/15.

 

quarta-feira, 29 de julho de 2015

O Falso Dilema da Não Felicidade no Casamento


 
         “Não nos casamos para ser felizes, mas para a glória de Deus”. Clichê!

            “Buscar a Deus é buscar a felicidade; encontrar Deus é a própria felicidade”. Agostinho.

 

            A frase clichê opõe duas coisas que não podem legitimamente ser colocadas em contradição: glória de Deus e felicidade humana.

            Deus criou o homem para uma existência plena, com a realização de todo seu potencial para amar, conhecer, criar, edificar, o que é a definição mais perfeita da felicidade. Deus criou o homem para ser feliz e, assim, glorifica-lO como Criador.  O estado de comunhão plena com Deus é o estado de maior felicidade do homem, pois cumpre completamente o propósito para o qual ele existe, e esse é também o estado que mais glorifica a Deus. O casamento é parte primordial desse projeto e, portanto, da felicidade do homem e da glória de Deus.

            A síntese agostiniana nos diz que o homem só pode ser feliz em Deus, tendo-O encontrado, em comunhão com Ele, inserido em seu propósito eterno que O glorifica plenamente. Não há oposição entre felicidade humana e glória de Deus. Bem ao contrário, são mesmo indissociáveis.

            Ocorre que, por causa do pecado, o propósito de Deus, para ser buscado e vivido nesta existência, inclui a realidade do sofrimento, pela decadência da natureza humana, pelos conflitos relacionais, pelas oposições espirituais, pelo caos da vida, pela deterioração da criação.

Nesse sentido, o sofrimento faz parte da felicidade nesta vida: “Felizes os que choram”, “Felizes os perseguidos”, “Nos alegramos nas tribulações”.

            Casamos para ser felizes dentro do propósito de Deus e para fazermos o outro feliz dentro do propósito de Deus, pois é só nesse propósito que a felicidade pode ser encontrada e a felicidade é mesmo essência dele, para que Deus seja glorificado. Os sofrimentos que nos sobrevierem nesse caminho farão parte desse projeto e poderão mesmo nos aperfeiçoar na santidade e nos indicar que estamos na direção correta em nossa jornada.

            O casamento é opcional e o cônjuge é escolhido livremente. Se não vemos possibilidade de felicidade no casamento este dificilmente cooperará para o propósito e glória de Deus.

            Ser o marido e ser a esposa que leva o outro a viver plenamente o propósito de Deus e a ser, dessa forma, feliz, para a glória de Deus. É disso que se trata um casamento e uma família.

            A graça de Jesus seja com todos.

 

            Fernando Saboia Vieira

 

           

Aniversário de Casamento de Gustavo e Rafaela


Amar e Encontrar
Poema Nupcial - Para Gustavo e Rafaela,

 

O que Deus ajuntou, não separe o homem.”

 

Dispam-se, joguem fora as roupas velhas

E se vejam.

Revistam-se, usem vestes novas,

Deixem os caminhos já andados,

Esqueçam as palavras desbotadas

E se descubram mais uma vez.

 

Troquem de pele, se reinventem,

Digam não e digam sim,

Fujam da esterilidade do talvez,

E depois comecem tudo de novo

Pintem tudo com cores novas

Vão a lugares aonde não tenham ido.


Vistam as roupas e calcem os sapatos

Um do outro,

Troquem de olhos e de olhares,

De língua e de sabores,

De humores e de dores,

De momentos e de sentimentos.

 

Leiam pensamentos, ouçam silêncios,

Respirem o mesmo ar até se intoxicarem

Com o hálito um do outro.

 

Misturem tudo na cabeça

E nos armários,

Troquem as gavetas e os sabonetes,

Os perfumes e os chinelos,

Os cremes e as escovas,

Confundam o dia com a noite,

Espalhem-se por todos os lados

E se recolham, finalmente, em abraços.

 

Divirtam-se sozinhos

E divirtam-se com todos,

Sonhem com pezinhos pequenos

Correndo pela casa.

 

Rejeitem com todas as forças

A eficiência burocrática doméstica

Como modelo de felicidade.

Saibam que a busca de bens materiais

Quase sempre produz mais dor do que prazer

E quando traz mais prazer do que dor

É chegado o império das trevas.

 

E se um dia qualquer da vida, em qualquer lugar,

Descobrirem que, estando juntos, estão em casa

E que, estando em casa, podem estar juntos

Em qualquer dia ou lugar da vida,

Saibam que não pertencem mais

A qualquer dia ou lugar,

Mas apenas um ao outro:

Vocês estarão, então, verdadeiramente casados,

Vocês serão um lar.

 

 

Brasília, 29 de julho de 2012, AD.

 

Fernando Sabóia Vieira

quinta-feira, 16 de julho de 2015

1ª aos Coríntios 13 para Todos


 

 
João 13:31-35; 1ª de João 2:7-11; 3:16-18; 4:7-8; Gálatas 5:13-15, 22; fésios 4:31 a 5:2; Colossenses 3:12-17; Romanos 12:9-21; Filipenses 2:1-11

          Gostaria de propor aos companheiros de jornada uma leitura particularizada do capítulo 13 da 1ª Carta de Paulo aos Coríntios, onde ele destaca a essência e centralidade do Amor de Deus na vida dos cristãos.

Considerando que os relacionamentos na Igreja são os ambientes primordiais de expressão do Amor de Deus, é importante estamos atentos a essa qualidade essencial desses vínculos, sem o que não seremos mesmo reconhecidos como discípulos de Jesus e não atingiremos a plenitude de vida que Ele nos propõe (João 12:31-35).

Corremos dois riscos quanto a isso na vida da Igreja. O primeiro é não haver relacionamentos significativos e frutíferos que promovam o a edificação. Ninguém pode atingir a plenitude da estatura de Cristo sem a cooperação do corpo.

O segundo é tornar os relacionamentos apenas funcionalidades do Corpo de Cristo, presos a estruturas e metas e, assim, descaracterizados como canais pessoais pelos quais a vida pode fluir (Efésios 4:11-16, 1ª aos Coríntios 12 e 14 etc.)

A reflexão que sugiro se desdobra em três trilogias: a primeira trilogia reúne três paradoxos do Amor; a segunda trilogia caracteriza a alma, o corpo e o espírito do Amor; e a terceira trilogia trata de três trilhas no caminho da maturidade apontadas pelo Amor.

O primeiro paradoxo da trilogia inicial está na impossível, mas necessária, arte de se comunicar.

É lugar comum apontar a importância e as dificuldades da comunicação nos relacionamentos, em razão de diferenças de gênero, de cultura, de histórias pessoais, de visões de mundo etc., tudo agravado pelo pecado.

Contudo, segundo Paulo, o problema da comunicação não reside nas diferenças nem na diversidade de códigos de linguagem que elas produzem, mas na ausência do Amor. As diferenças de linguagens não são superáveis complemente porque correspondem a diferenças de natureza. Somos diferentes mesmo e isso produz distanciamentos, desconfianças e temores. Temos um instinto inato de autopreservação e somos dominados pelo egoísmo fruto do pecado.

Sem o Amor não há comunicação porque apenas o Amor é capaz de superar essas barreiras e promover uma real aproximação e contato entre pessoas. Do contrário, sem o Amor, as próprias palavras se tornam armas do distanciamento e da não comunicação. Quem não ama fala apenas para si mesmo, não para o outro, por quem não tem interesse verdadeiro.

Só o Amor desarma e aproxima. Ele faz das diferenças pontes capazes de cobrir abismos e caminhos que ligam lugares distantes porque acolhe incondicionalmente, elimina o temor da rejeição e do abuso ao se oferecer sem ressalvas.

Muito esforço e energia é gasto, às vezes, por pessoas que tentam “se entender”. O caminho mais excelente que queremos sugerir, inspirados por esse texto bíblico, é que mais dedicação se tenha em simplesmente amar o outro com o Amor que procede de Deus.

Muitas vezes, a busca da comunicação disfarça propósitos de manipulação, de controle, de imposição da própria vontade. Isso apenas fortalecerá as barreiras porventura existentes.

Se houver uma genuína busca de amar, cada um estará seguro para se deixar conhecer e verdadeiramente interessado em conhecer o outro. E não seremos como metais a produzir ruídos sem sentido, mas nos edificaremos uns aos outros “falando a verdade em amor” (Efésios 4:15).

O segundo paradoxo está na constatação de que saber o que fazer não é suficiente. Conhecer todos os mistérios e toda a ciência, sem Amor, não produz nada. Por vezes, conhecemos a verdade, a vontade e o padrão de Deus e somos capazes de bem discorrer sobre o papel que cabe a cada um na vida da Igreja, mas, ainda assim, não conseguimos viver satisfatoriamente na comunhão.

O fato é que a eficiência burocrática não produz edificação. A correção doutrinária por si mesma não produz a Igreja.

Só o Amor conhece a Deus e é capaz de expressar sua verdade e vontade. Apenas o Amor cumpre o propósito de Deus e ele sozinho é suficiente para cumprir esse propósito (Gálatas 5:13-15).

Sem Amor, a despeito de todo o conhecimento, “nada serei” porque só o Amor gera identidade pessoal, valor, significado e sentido. Como disse o apóstolo em outro lugar, “o saber ensoberbece, mas o amor edifica” (1ª aos Coríntios 8:1). Nas palavras de Santo Agostinho, “não se chega à verdade senão por meio do amor”.

O terceiro paradoxo da primeira trilogia transparece quando percebemos que fazer o que se sabe sobre amar não é suficiente. Amar é renunciar, doar e servir, mas o Amor não é a renúncia, a doação ou o serviço. O Amor é a motivação, a essência, a finalidade e a recompensa de renunciar, dar e servir, mas, como natureza de Deus, não se limita nem se esgota em nenhum gesto ou atitude.

O que fazemos para o outro fazemos por amor ou temos outras motivações e propósitos? Não estaremos às vezes mais interessados em cumprir nosso papel e estarmos “certos” e “termos razão” do que realmente no bem do outro? O Amor é a motivação de tudo, mas ele próprio é imotivado, é suficiente em si mesmo e quando está ausente nada tem valor ou sentido. Não existe a verdade sem o Amor, como não pode haver o Amor sem a verdade.

Devemos, pois amar, de fato e de verdade, não apenas de palavras, sem hipocrisia (1ª de João 3:18; Romanos 12:9).

A segunda trilogia que encontramos em 1ª aos Coríntios 13 compreende a alma, o corpo e o espírito do Amor.

Pensamos, inicialmente, que a alma do Amor é calma. São suaves o seu pensar, seu sentir, seu querer, seu entender e seu saber. São as suas expressões de pensamento, sentimento e vontade sempre gentis, mansas, pacientes, bondosas, altruístas. O Amor é humilde, acolhedor, amigável, fraterno. É resiliente, perseverante, mais forte do que a morte.

Perguntamos: é essa a alma dos nossos relacionamentos? É assim nosso trato um com o outro? São essas as qualidades de nossas ações e palavras? Ou a convivência, a intimidade, a pressa, as divergências, as frustrações e dificuldades nos tornam ásperos, impacientes, exigentes, pessimistas? Temos o mesmo sentimento que houve em Cristo e consideramos os outros sempre antes de nós mesmos? (Filipenses 2:1-11)

Não se trata de sentimentalismo, mas de força de caráter, de virtude. Não é uma possibilidade humana, não é uma questão de personalidade, mas de santidade, que só pode ser produzida por Deus. Por isso, o Amor não se irrita, perdoa sempre, não se ressente do mal, não se magoa, não é melindroso, não suspeita do outro.

Depois, dizemos que o corpo do Amor é conforto. Ele não agride, não se impõe, não oprime, não intimida, não amedronta, não afugenta.

É acolhedor, convidativo, agradável. Não reclama, não chantageia, não chateia, não chama atenção para si mesmo, para as próprias vontades e necessidades, não se comporta mal, não é inconveniente.

Você é confortável para as pessoas? É acolhedor, agradável, alguém que atrai para fazer bem? Ou é de difícil trato, cheio de melindres, complicado, exigente, crítico? Quando as pessoas encontram você, elas relaxam e se sentem bem ou ficam tensas e preocupadas?

Devemos, pois, nos revestir de ternos afetos de misericórdia, atentos ao modo como falamos e tratamos os irmãos, aos pensamentos e sentimentos que nutrimos por eles (Efésios 4:31 a 5:2 ; Colossenses 3:12-17).

Finalmente, qual o espírito do Amor senão o Espírito do Amor de Deus? O Amor é elemento essencial, primordial, criacional, constitutivo de tudo o que existe. Não pode ser decomposto, limitado, condicionado, fracionado. Não varia com tempos e circunstâncias.

Por isso, o Amor tudo... tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta. Como essência de Deus, o Amor não se define, mas pode ser vivido, experimentado, demonstrado, qualificado.

Qual o espírito do nosso amor? Um espírito humano limitado, condicionado, inconstante? Ou amamos com o Amor de Deus e não guardamos qualquer tipo de contabilidade, não abrigamos qualquer cobrança, não nos arvoramos em direitos, mas somos felizes por transmitir o que recebemos graciosamente do Pai?

Na terceira trilogia identificamos três trilhas no caminho sobremodo excelente do Amor que nos conduz à plenitude.

A primeira trilha nesse caminho tem a ver com a aceitação de nossa incompletude, que transparece dolorosa e verdadeiramente nos relacionamentos próximos.

Somos parciais, incompletos, inacabados. O Amor não vê isso como um problema, mas como motivação para o progresso na senda espiritual, por meio da aceitação, do estímulo, do compartilhamento, da sinergia, da comunhão e da cooperação. Na Igreja, por meio dos vínculos do Corpo, estamos debaixo do mesmo jugo (suzugos), somos cooperadores (synergos, mesma obra) e comungantes (koinonos, mesma união com Cristo). Imperfeitamente conhecemos e falamos, mas um dia o pleno e perfeito se manifestará nas nossas vidas. O amor caminha para esse encontro, espera por ele, busca levar o outro até a Presença.

A segunda trilha se apresenta em forma de um desafio, o desafio da intimidade.

Quando amamos e somos amados nos revelamos e nos conhecemos. Mas conhecer e se dar a conhecer é um processo doloroso que envolve o medo da rejeição, que só pode ser vencido pela perseverança do Amor.

Somos desafiados na exposição dos relacionamentos. Em alguns momentos somos tentados a retroceder e a nos fecharmos novamente e, assim, limitarmos o Amor. É necessário continuar nessa trilha até que sejamos alcançados pelo pleno conhecimento do Deus que nos conhece plenamente.

A terceira trilha, que fecha a terceira trilogia, ser refere ao paradoxo que opõe e harmoniza a concretude da fé e a inconcretude da esperança na essencialidade do Amor.

A fé torna concreta, existencial, a verdade revelada, produz na existência presente a realidade eterna do Reino de Deus. A fé nos conduz nas circunstâncias e dificuldades da vida, nos confere conhecimentos e capacidades e produz em nós as virtudes divinas.

A esperança, por sua vez, nos leva aos portais da dimensão não concreta da realidade de Deus, que é a eternidade. Ela nos mantém seguros e direcionados nos lugares sombrios e nos mares revoltos por onde havemos de passar em nossa jornada para a Casa do Pai.

Na dinâmica dos relacionamentos pessoais, fé e esperança, compartilhadas e alimentadas, são essenciais para nos manter ligados à fonte do Amor de Deus, ou melhor, a Deus, que é a fonte de todo Amor.

A fé nos dá o poder de viver o Reino de Deus agora, na vida que temos. A esperança nos acalenta, nos envolve e nos alegra na expectativa da manifestação da vida eterna. O Amor nos transforma continuamente na imagem de Deus, desde o princípio e até o fim.

Finalmente, pensamos na alteridade do Amor. Deus é amor. Eu não sou Amor. O Amor tem sua origem e fonte em Deus. Se Deus não estiver em mim, não haverá Amor em mim. Se Deus me transformar em Sua Imagem e Semelhança por meio do Seu Espírito, Ele produzirá em mim o Seu fruto, e haverá Amor em mim, e eu serei Amor.

Eu sou a terra onde a semente pode ser lançada. Uma vez germinada, eu posso sustentá-la, alimentá-la, protegê-la até ver seu fruto em mim. Ou posso negligenciá-la e deixa-la perecer.

O Amor é algo que posso receber de Deus, experimentar, viver, transmitir, exercitar, praticar, obedecer. O Amor é externo a mim. Ele tem suas características e procedimentos distintos dos meus.

Eu não sou o que o Amor é.

Eu sou o que o Amor não é.

Eu não faço o que o Amor faz.

Eu faço o que o Amor não faz.

No entanto, se o Amor permanece em mim, eu posso escolher ser e fazer o que Ele é e faz e, assim, ir me tornando o que Ele é e me comportando como Ele.

Devo praticar: “Eu não sou paciente, mas o Amor é paciente. O amor de Deus está em mim, foi derramado no meu coração pelo Espirito Santo que me foi outorgado. Deus me ama com paciência. Vou-me revestir da paciência do Amor, negar-me a mim mesmo, e amar com o Amor paciente de Deus”. E assim para cada característica e atitude do Amor: benignidade, humildade, perseverança, altruísmo etc.

Desse modo, o Espírito Sando vai nos transformar e regenerar nossa natureza caída, produzindo em nós nossa verdadeira identidade divina. Fomos criados originalmente à Imagem e Semelhança do Deus que é Amor e Seu propósito é nos levar a viver isso plenamente.

Esse é o caminho “sobremodo excelente”. Essa é a característica essencial e definidora dos discípulos de Jesus. Esse é o caráter dos filhos de Deus. Esse é o fruto do Espírito Santo.

Que a graça do Senhor Jesus seja com todos.

Brasília, julho de 2015.

Fernando Sabóia Vieira


As Trilogias do Amor

 

A alma do amor é calma

E descansa

No conforto de seu corpo

Que é acolhimento

Na essência de um espírito manso

E intenso

Que comunica a felicidade amiga

Da Presença de Deus

 

O amor revela a alma

Quando fala e quando se cala,

O amor serve o corpo

Quando faz e quando espera,

O amor eleva o espírito

Quando luta e quando sofre

 

Os caminhos do amor

Plenificam a intimidade

Aproximam as incompletudes

Na vivência da fé

Nas viagens da esperança

Nas vitórias do Amor de Deus        

 

Fernando Sabóia Vieira

sexta-feira, 26 de junho de 2015

Primeira aos Coríntios 13 para Casais


 
 
Gostaria de propor aos casais companheiros de jornada uma leitura particularizada do capítulo 13 da 1ª Carta de Paulo aos Coríntios, onde ele destaca a essência e centralidade do Amor de Deus na vida dos cristãos.

Considerando que o relacionamento conjugal é um ambiente especialíssimo de expressão do amor de Deus, comparado, por um lado, ao amor de Jesus pela Igreja e, por outro, sujeito a todas as contradições, mazelas e intempéries produzidas pelo pecado na natureza humana, é edificante, e talvez mesmo essencial, meditar sobre o que o Apóstolo escreve acerca desse Amor para aplicar ao contexto do relacionamento homem e mulher no casamento.

Devo destacar, de início, que o Amor de Deus no casamento também se expressa na fraternidade, na amizade e na sexualidade, que são aspectos fundamentais e constitutivos da união entre homem e mulher. Ao buscarmos compreender a essência espiritual do Amor divino descrita nesse texto insuperável de Paulo não estamos, de nenhum modo, colocando em segundo plano essas outras manifestações do amor na vida humana, mas, ao contrário, dando-lhes seu verdadeiro sentido em Deus, para que possam ser vividas e desfrutadas plenamente. Assim, tudo o que se disser a seguir será aplicável a todas essas dimensões de amar que estão presentes matrimônio.

A reflexão que sugiro se desdobra em três trilogias: a primeira trilogia reúne três paradoxos do Amor; a segunda trilogia caracteriza a alma, o corpo e o espírito do Amor; e a terceira trilogia trata de três trilhas no caminho da maturidade apontadas pelo Amor.

O primeiro paradoxo da trilogia inicial está na impossível, mas necessária, arte de se comunicar. É lugar comum apontar a importância e as dificuldades da comunicação entre homem e mulher no casamento, em razão de diferenças de gênero, de cultura, de histórias pessoais, de visões de mundo etc., tudo agravado pelo pecado.

 Contudo, segundo Paulo, o problema da comunicação não reside nas diferenças nem na diversidade de códigos de linguagem que elas produzem, mas na ausência do Amor. As diferenças de linguagens não são superáveis complemente porque correspondem a diferenças de natureza. Somos diferentes mesmo e isso produz distanciamentos, desconfianças, temores. Temos um instinto inato de autopreservação e somos dominados pelo egoísmo fruto do pecado. Sem o Amor não há comunicação porque apenas o Amor é capaz de superar essas barreiras e promover uma real aproximação e contato entre pessoas. Do contrário, sem o Amor, as próprias palavras se tornam armas do distanciamento e da não comunicação.

Só o Amor desarma e aproxima. Ele faz das diferenças pontes capazes de cobrir abismos e caminhos que ligam lugares distantes porque acolhe incondicionalmente, elimina o temor da rejeição e do abuso ao se oferecer sem ressalvas.

Muito esforço e energia é gasto, às vezes, por casais que tentam “se entender”. O caminho mais excelente que queremos sugerir, inspirados por esse texto bíblico, é que mais dedicação se tenha em simplesmente amar o outro com o Amor que procede de Deus. Muitas vezes, a busca da comunicação disfarça propósitos de manipulação, de controle, de imposição da própria vontade. Isso apenas fortalecerá as barreiras porventura existentes. Se houver uma genuína busca de amar, cada um estará seguro para se deixar a conhecer e verdadeiramente interessado em conhecer o outro. E não seremos como metais a produzir ruídos sem sentido.

O segundo paradoxo está na constatação de que saber o que fazer não é suficiente. Conhecer todos os mistérios e toda a ciência, sem amor, não produz nada. Por vezes, conhecemos a verdade, a vontade e o padrão de Deus e somos capazes de bem discorrer sobre o papel que cabe a cada um no casamento, mas, ainda assim, não conseguimos viver satisfatoriamente a vida conjugal.

O fato é que a eficiência burocrática não produz um lar. Só o Amor conhece a Deus e é capaz de expressar sua verdade e vontade. Apenas o Amor cumpre o propósito de Deus e ele sozinho é suficiente para cumprir esse propósito. Sem Amor, a despeito de todo o conhecimento, “nada serei” porque só o Amor gera identidade pessoal, valor, significado e sentido.

 O terceiro paradoxo da primeira trilogia transparece quando percebemos que fazer o que se sabe sobre amar não é suficiente. Amar é renunciar, doar e servir, mas o Amor não é a renúncia, a doação ou o serviço. O Amor é a motivação, a essência, a finalidade e a recompensa de renunciar, dar e servir, mas, como natureza de Deus, não se limita nem se esgota em nenhum gesto ou atitude.

O que fazemos para o outro fazemos por amor ou temos outras motivações e propósitos? Estamos mais interessados em cumprir nosso papel e estarmos “certos” e “termos razão” do que realmente no bem do outro? O Amor é a motivação de tudo, mas ele próprio é imotivado, é suficiente em si mesmo e quando está ausente nada tem valor ou sentido. Não existe a verdade sem o Amor, como não pode haver o Amor sem a verdade.

A segunda trilogia que encontramos em 1ª aos Coríntios 13 compreende a alma, o corpo e o espírito do Amor.

Pensamos, inicialmente, que a alma do Amor é calma. São suaves o seu pensar, seu sentir, seu querer, seu entender e seu saber. São as suas expressões de pensamento, sentimento e vontade sempre gentis, mansas, pacientes, bondosas, altruístas. O Amor é humilde, acolhedor, amigável, fraterno. É resiliente, perseverante, mais forte do que a morte.

Perguntamos: é essa a alma do nosso relacionamento conjugal? É assim nosso trato um com o outro? São essas as qualidades de nossas ações e palavras? Ou a convivência, a intimidade, a pressa, as divergências, as frustrações e dificuldades nos tornam ásperos, impacientes, exigentes, pessimistas?

Não se trata de sentimentalismo, mas de força de caráter, de virtude. Por isso, o Amor não se irrita, perdoa sempre, não se ressente do mal, não se magoa, não é melindroso, não suspeita do outro.

Depois, dizemos que o corpo do Amor é conforto. Ele não agride, não se impõe, não oprime, não intimida, não amedronta, não afugenta. É acolhedor, convidativo, agradável. Não reclama, não chantageia, não chateia, não chama atenção para si mesmo, para as próprias vontades e necessidades, não se comporta mal, não é inconveniente.

Você é confortável para seu cônjuge? É acolhedor, agradável, alguém que atrai para fazer bem? Ou é de difícil trato, cheio de melindres, complicado, exigente, crítico? Quando sua esposa ou seu marido encontra você relaxa e se sente bem ou fica tenso e preocupado?

Finalmente, qual o espírito do Amor senão o Espírito do Amor de Deus? O Amor é elemento essencial, primordial, criacional, constitutivo de tudo o que existe. Não pode ser decomposto, limitado, condicionado, fracionado. Não varia com tempos e circunstâncias. Por isso, o Amor tudo... tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta. Como essência de Deus, o Amor não se define, mas pode ser vivido, experimentado, demonstrado, qualificado.

Qual o espírito do nosso amor? Um espírito humano limitado, condicionado, inconstante? Ou amamos com o Amor de Deus e não guardamos qualquer tipo de contabilidade, não abrigamos qualquer cobrança, não nos arvoramos em direitos, mas somos felizes por transmitir o que recebemos graciosamente do Pai?

Na terceira trilogia identificamos três trilhas no caminho sobremodo excelente do Amor que nos conduz à plenitude.

A primeira trilha nesse caminho tem a ver com a aceitação de nossa incompletude, que transparece dolorosa e verdadeiramente no casamento.

Somos parciais, incompletos, inacabados. O Amor não vê isso como um problema, mas como motivação para o progresso na senda espiritual, por meio da aceitação, do estímulo, do compartilhamento, da sinergia, da comunhão e da cooperação. Pelo vínculo matrimonial, somos cônjuges (suzugos, mesmo jugo), cooperadores (synergos, mesma obra) e comungantes (koinonos, mesma comunhão com Cristo). Imperfeitamente conhecemos e falamos, mas um dia o pleno e perfeito se manifestará nas nossas vidas. O amor caminha para esse encontro, espera por ele, busca levar o outro até a Presença.

A segunda trilha se apresenta em forma de um desafio, o desafio da intimidade.

Quando amamos e somos amados nos revelamos e nos conhecemos. Mas conhecer e se dar a conhecer é um processo doloroso que envolve o medo da rejeição, que só pode ser vencido pela perseverança do Amor. Somos desafiados na exposição íntima do casamento. Em alguns momentos somos tentados a retroceder e a nos fecharmos novamente e, assim, limitarmos o Amor. É necessário continuar nessa trilha até que sejamos alcançados pelo pleno conhecimento do Deus que nos conhece plenamente. O ser uma só carne é a representação e experiência da intimidade que deve haver entre o Senhor e Sua Noiva e no casamento temos oportunidade de viver e receber dessa graça.

A terceira trilha, que fecha a terceira trilogia, ser refere ao paradoxo que opõe e harmoniza a concretude da fé e a inconcretude da esperança na essencialidade do Amor.

A fé torna concreta, existencial, a verdade revelada, produz na existência presente a realidade eterna do Reino de Deus. A fé nos conduz nas circunstâncias e dificuldades concretas da vida, nos conferindo conhecimento e capacidades e produzindo em nós as virtudes divinas.

A esperança, por sua vez, nos leva aos portais da outra dimensão da realidade de Deus, que é a eternidade. Ela nos mantém seguros e direcionados nos lugares sombrios e nos mares revoltos por onde havemos de passar.

Na dinâmica do relacionamento pessoal e íntimo do casamento, fé e esperança compartilhadas a alimentadas, são essencial para nos manter ligados à fonte do Amor de Deus, ou melhor, a Deus, que é a fonte de todo Amor.

A fé nos dá o poder de viver o Reino de Deus agora, na vida que temos. A esperança nos acalenta, nos envolve e nos alegra na expectativa da manifestação do Reino. O Amor nos transforma continuamente na imagem de Deus, desde o princípio e até o fim.

 

As Trilogias do Amor

 

A alma do amor é calma

E descansa

No conforto de seu corpo

Que é acolhimento

Na essência de um espírito manso

E intenso

Que comunica a felicidade amiga

Da Presença de Deus

 

O amor revela a alma

Quando fala e quando se cala,

O amor serve o corpo

Quando faz e quando espera,

O amor eleva o espírito

Quando luta e quando sofre

 

Os caminhos do amor

Plenificam a intimidade

Aproximam as incompletudes

Na vivência da fé

Nas viagens da esperança

Nas vitórias do Amor de Deus


                  Fernando Sabóia Vieira, junho de 2015.