quinta-feira, 16 de julho de 2015

1ª aos Coríntios 13 para Todos


 

 
João 13:31-35; 1ª de João 2:7-11; 3:16-18; 4:7-8; Gálatas 5:13-15, 22; fésios 4:31 a 5:2; Colossenses 3:12-17; Romanos 12:9-21; Filipenses 2:1-11

          Gostaria de propor aos companheiros de jornada uma leitura particularizada do capítulo 13 da 1ª Carta de Paulo aos Coríntios, onde ele destaca a essência e centralidade do Amor de Deus na vida dos cristãos.

Considerando que os relacionamentos na Igreja são os ambientes primordiais de expressão do Amor de Deus, é importante estamos atentos a essa qualidade essencial desses vínculos, sem o que não seremos mesmo reconhecidos como discípulos de Jesus e não atingiremos a plenitude de vida que Ele nos propõe (João 12:31-35).

Corremos dois riscos quanto a isso na vida da Igreja. O primeiro é não haver relacionamentos significativos e frutíferos que promovam o a edificação. Ninguém pode atingir a plenitude da estatura de Cristo sem a cooperação do corpo.

O segundo é tornar os relacionamentos apenas funcionalidades do Corpo de Cristo, presos a estruturas e metas e, assim, descaracterizados como canais pessoais pelos quais a vida pode fluir (Efésios 4:11-16, 1ª aos Coríntios 12 e 14 etc.)

A reflexão que sugiro se desdobra em três trilogias: a primeira trilogia reúne três paradoxos do Amor; a segunda trilogia caracteriza a alma, o corpo e o espírito do Amor; e a terceira trilogia trata de três trilhas no caminho da maturidade apontadas pelo Amor.

O primeiro paradoxo da trilogia inicial está na impossível, mas necessária, arte de se comunicar.

É lugar comum apontar a importância e as dificuldades da comunicação nos relacionamentos, em razão de diferenças de gênero, de cultura, de histórias pessoais, de visões de mundo etc., tudo agravado pelo pecado.

Contudo, segundo Paulo, o problema da comunicação não reside nas diferenças nem na diversidade de códigos de linguagem que elas produzem, mas na ausência do Amor. As diferenças de linguagens não são superáveis complemente porque correspondem a diferenças de natureza. Somos diferentes mesmo e isso produz distanciamentos, desconfianças e temores. Temos um instinto inato de autopreservação e somos dominados pelo egoísmo fruto do pecado.

Sem o Amor não há comunicação porque apenas o Amor é capaz de superar essas barreiras e promover uma real aproximação e contato entre pessoas. Do contrário, sem o Amor, as próprias palavras se tornam armas do distanciamento e da não comunicação. Quem não ama fala apenas para si mesmo, não para o outro, por quem não tem interesse verdadeiro.

Só o Amor desarma e aproxima. Ele faz das diferenças pontes capazes de cobrir abismos e caminhos que ligam lugares distantes porque acolhe incondicionalmente, elimina o temor da rejeição e do abuso ao se oferecer sem ressalvas.

Muito esforço e energia é gasto, às vezes, por pessoas que tentam “se entender”. O caminho mais excelente que queremos sugerir, inspirados por esse texto bíblico, é que mais dedicação se tenha em simplesmente amar o outro com o Amor que procede de Deus.

Muitas vezes, a busca da comunicação disfarça propósitos de manipulação, de controle, de imposição da própria vontade. Isso apenas fortalecerá as barreiras porventura existentes.

Se houver uma genuína busca de amar, cada um estará seguro para se deixar conhecer e verdadeiramente interessado em conhecer o outro. E não seremos como metais a produzir ruídos sem sentido, mas nos edificaremos uns aos outros “falando a verdade em amor” (Efésios 4:15).

O segundo paradoxo está na constatação de que saber o que fazer não é suficiente. Conhecer todos os mistérios e toda a ciência, sem Amor, não produz nada. Por vezes, conhecemos a verdade, a vontade e o padrão de Deus e somos capazes de bem discorrer sobre o papel que cabe a cada um na vida da Igreja, mas, ainda assim, não conseguimos viver satisfatoriamente na comunhão.

O fato é que a eficiência burocrática não produz edificação. A correção doutrinária por si mesma não produz a Igreja.

Só o Amor conhece a Deus e é capaz de expressar sua verdade e vontade. Apenas o Amor cumpre o propósito de Deus e ele sozinho é suficiente para cumprir esse propósito (Gálatas 5:13-15).

Sem Amor, a despeito de todo o conhecimento, “nada serei” porque só o Amor gera identidade pessoal, valor, significado e sentido. Como disse o apóstolo em outro lugar, “o saber ensoberbece, mas o amor edifica” (1ª aos Coríntios 8:1). Nas palavras de Santo Agostinho, “não se chega à verdade senão por meio do amor”.

O terceiro paradoxo da primeira trilogia transparece quando percebemos que fazer o que se sabe sobre amar não é suficiente. Amar é renunciar, doar e servir, mas o Amor não é a renúncia, a doação ou o serviço. O Amor é a motivação, a essência, a finalidade e a recompensa de renunciar, dar e servir, mas, como natureza de Deus, não se limita nem se esgota em nenhum gesto ou atitude.

O que fazemos para o outro fazemos por amor ou temos outras motivações e propósitos? Não estaremos às vezes mais interessados em cumprir nosso papel e estarmos “certos” e “termos razão” do que realmente no bem do outro? O Amor é a motivação de tudo, mas ele próprio é imotivado, é suficiente em si mesmo e quando está ausente nada tem valor ou sentido. Não existe a verdade sem o Amor, como não pode haver o Amor sem a verdade.

Devemos, pois amar, de fato e de verdade, não apenas de palavras, sem hipocrisia (1ª de João 3:18; Romanos 12:9).

A segunda trilogia que encontramos em 1ª aos Coríntios 13 compreende a alma, o corpo e o espírito do Amor.

Pensamos, inicialmente, que a alma do Amor é calma. São suaves o seu pensar, seu sentir, seu querer, seu entender e seu saber. São as suas expressões de pensamento, sentimento e vontade sempre gentis, mansas, pacientes, bondosas, altruístas. O Amor é humilde, acolhedor, amigável, fraterno. É resiliente, perseverante, mais forte do que a morte.

Perguntamos: é essa a alma dos nossos relacionamentos? É assim nosso trato um com o outro? São essas as qualidades de nossas ações e palavras? Ou a convivência, a intimidade, a pressa, as divergências, as frustrações e dificuldades nos tornam ásperos, impacientes, exigentes, pessimistas? Temos o mesmo sentimento que houve em Cristo e consideramos os outros sempre antes de nós mesmos? (Filipenses 2:1-11)

Não se trata de sentimentalismo, mas de força de caráter, de virtude. Não é uma possibilidade humana, não é uma questão de personalidade, mas de santidade, que só pode ser produzida por Deus. Por isso, o Amor não se irrita, perdoa sempre, não se ressente do mal, não se magoa, não é melindroso, não suspeita do outro.

Depois, dizemos que o corpo do Amor é conforto. Ele não agride, não se impõe, não oprime, não intimida, não amedronta, não afugenta.

É acolhedor, convidativo, agradável. Não reclama, não chantageia, não chateia, não chama atenção para si mesmo, para as próprias vontades e necessidades, não se comporta mal, não é inconveniente.

Você é confortável para as pessoas? É acolhedor, agradável, alguém que atrai para fazer bem? Ou é de difícil trato, cheio de melindres, complicado, exigente, crítico? Quando as pessoas encontram você, elas relaxam e se sentem bem ou ficam tensas e preocupadas?

Devemos, pois, nos revestir de ternos afetos de misericórdia, atentos ao modo como falamos e tratamos os irmãos, aos pensamentos e sentimentos que nutrimos por eles (Efésios 4:31 a 5:2 ; Colossenses 3:12-17).

Finalmente, qual o espírito do Amor senão o Espírito do Amor de Deus? O Amor é elemento essencial, primordial, criacional, constitutivo de tudo o que existe. Não pode ser decomposto, limitado, condicionado, fracionado. Não varia com tempos e circunstâncias.

Por isso, o Amor tudo... tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta. Como essência de Deus, o Amor não se define, mas pode ser vivido, experimentado, demonstrado, qualificado.

Qual o espírito do nosso amor? Um espírito humano limitado, condicionado, inconstante? Ou amamos com o Amor de Deus e não guardamos qualquer tipo de contabilidade, não abrigamos qualquer cobrança, não nos arvoramos em direitos, mas somos felizes por transmitir o que recebemos graciosamente do Pai?

Na terceira trilogia identificamos três trilhas no caminho sobremodo excelente do Amor que nos conduz à plenitude.

A primeira trilha nesse caminho tem a ver com a aceitação de nossa incompletude, que transparece dolorosa e verdadeiramente nos relacionamentos próximos.

Somos parciais, incompletos, inacabados. O Amor não vê isso como um problema, mas como motivação para o progresso na senda espiritual, por meio da aceitação, do estímulo, do compartilhamento, da sinergia, da comunhão e da cooperação. Na Igreja, por meio dos vínculos do Corpo, estamos debaixo do mesmo jugo (suzugos), somos cooperadores (synergos, mesma obra) e comungantes (koinonos, mesma união com Cristo). Imperfeitamente conhecemos e falamos, mas um dia o pleno e perfeito se manifestará nas nossas vidas. O amor caminha para esse encontro, espera por ele, busca levar o outro até a Presença.

A segunda trilha se apresenta em forma de um desafio, o desafio da intimidade.

Quando amamos e somos amados nos revelamos e nos conhecemos. Mas conhecer e se dar a conhecer é um processo doloroso que envolve o medo da rejeição, que só pode ser vencido pela perseverança do Amor.

Somos desafiados na exposição dos relacionamentos. Em alguns momentos somos tentados a retroceder e a nos fecharmos novamente e, assim, limitarmos o Amor. É necessário continuar nessa trilha até que sejamos alcançados pelo pleno conhecimento do Deus que nos conhece plenamente.

A terceira trilha, que fecha a terceira trilogia, ser refere ao paradoxo que opõe e harmoniza a concretude da fé e a inconcretude da esperança na essencialidade do Amor.

A fé torna concreta, existencial, a verdade revelada, produz na existência presente a realidade eterna do Reino de Deus. A fé nos conduz nas circunstâncias e dificuldades da vida, nos confere conhecimentos e capacidades e produz em nós as virtudes divinas.

A esperança, por sua vez, nos leva aos portais da dimensão não concreta da realidade de Deus, que é a eternidade. Ela nos mantém seguros e direcionados nos lugares sombrios e nos mares revoltos por onde havemos de passar em nossa jornada para a Casa do Pai.

Na dinâmica dos relacionamentos pessoais, fé e esperança, compartilhadas e alimentadas, são essenciais para nos manter ligados à fonte do Amor de Deus, ou melhor, a Deus, que é a fonte de todo Amor.

A fé nos dá o poder de viver o Reino de Deus agora, na vida que temos. A esperança nos acalenta, nos envolve e nos alegra na expectativa da manifestação da vida eterna. O Amor nos transforma continuamente na imagem de Deus, desde o princípio e até o fim.

Finalmente, pensamos na alteridade do Amor. Deus é amor. Eu não sou Amor. O Amor tem sua origem e fonte em Deus. Se Deus não estiver em mim, não haverá Amor em mim. Se Deus me transformar em Sua Imagem e Semelhança por meio do Seu Espírito, Ele produzirá em mim o Seu fruto, e haverá Amor em mim, e eu serei Amor.

Eu sou a terra onde a semente pode ser lançada. Uma vez germinada, eu posso sustentá-la, alimentá-la, protegê-la até ver seu fruto em mim. Ou posso negligenciá-la e deixa-la perecer.

O Amor é algo que posso receber de Deus, experimentar, viver, transmitir, exercitar, praticar, obedecer. O Amor é externo a mim. Ele tem suas características e procedimentos distintos dos meus.

Eu não sou o que o Amor é.

Eu sou o que o Amor não é.

Eu não faço o que o Amor faz.

Eu faço o que o Amor não faz.

No entanto, se o Amor permanece em mim, eu posso escolher ser e fazer o que Ele é e faz e, assim, ir me tornando o que Ele é e me comportando como Ele.

Devo praticar: “Eu não sou paciente, mas o Amor é paciente. O amor de Deus está em mim, foi derramado no meu coração pelo Espirito Santo que me foi outorgado. Deus me ama com paciência. Vou-me revestir da paciência do Amor, negar-me a mim mesmo, e amar com o Amor paciente de Deus”. E assim para cada característica e atitude do Amor: benignidade, humildade, perseverança, altruísmo etc.

Desse modo, o Espírito Sando vai nos transformar e regenerar nossa natureza caída, produzindo em nós nossa verdadeira identidade divina. Fomos criados originalmente à Imagem e Semelhança do Deus que é Amor e Seu propósito é nos levar a viver isso plenamente.

Esse é o caminho “sobremodo excelente”. Essa é a característica essencial e definidora dos discípulos de Jesus. Esse é o caráter dos filhos de Deus. Esse é o fruto do Espírito Santo.

Que a graça do Senhor Jesus seja com todos.

Brasília, julho de 2015.

Fernando Sabóia Vieira


As Trilogias do Amor

 

A alma do amor é calma

E descansa

No conforto de seu corpo

Que é acolhimento

Na essência de um espírito manso

E intenso

Que comunica a felicidade amiga

Da Presença de Deus

 

O amor revela a alma

Quando fala e quando se cala,

O amor serve o corpo

Quando faz e quando espera,

O amor eleva o espírito

Quando luta e quando sofre

 

Os caminhos do amor

Plenificam a intimidade

Aproximam as incompletudes

Na vivência da fé

Nas viagens da esperança

Nas vitórias do Amor de Deus        

 

Fernando Sabóia Vieira

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