A Igreja no século XXII: Um Manifesto
E se o mundo não acabar no ano que vem, nem naspróximas décadas?
(Fernando Saboia Vieira, dezembro de 2020, AD)
Gostaria de propor aqui uma reflexão sobre a postura da Igreja cristã na sociedade contemporânea, preocupado que tenho estado, como tantos outros, com as pressões “deste século” sobre o cristianismo e sobre os cristãos, tanto em relação a conceitos e ideias, quanto a valores e comportamentos e quanto à proclamação do Reino de Deus nesta era da história humana.
O que se pode perceber é que uma parte expressiva da Igreja espalhada pelo mundo, e no nosso País, tem buscado seus espaços de presença e de relevância diante das pessoas na sociedademoderna “conformando-se a este século”. Infelizmente, muitos que se identificam como cristãos, e mesmo como líderes, ministros e pastores,têm assumido, conscientemente ou não, as formas, jeitos e trejeitos desta geração, seus valores, gostos, cores, ritmos, vocabulários, estilos de vida, símbolos de status, linguagens, manias, padrões de sucesso, metodologias, conceitos, consensos e causas.
Tem-se produzido, assim, ao longo dos últimos anos, uma grotesca subcultura “gospel”, todavia muito lucrativa para alguns oportunistas que se apresentam como lideranças, representantes, artistas, influenciadores, gestores, coachs, conselheiros, famosos, produtores de conteúdos, consultores, gurus e especialistas em qualquer, ávidos pela aprovação do mundo e por encherem o ego e a conta bancária. Não poucos escândalos esses têm provocado envolvendo o nome do Senhor.
Enquanto isso, outra parte da Igreja, escandalizada, não sem razão, com o crescimento da iniquidade e o esfriamento do amor, e amedrontada, talvez demasiadamente, com o avanço do mundanismo em todos os segmentos da sociedade,refugia-se no escapismo escatológico, no profetismo de ocasião, nas suas comunidades locais e familiares,presenciais ou virtuais, “sacode o pó das sandálias”, anuncia o fim do mundo, e abandona a missão de amar as pessoas, servi-las e a elas proclamar o Reino de Deus.
Prefere, a pretexto de manter-se santa, se esconder em guetos sociais, culturais, religiosos e geográficos, em grupos fechados e em círculos restritos de relacionamentos, mais preocupada com a própria preservação, de seus filhos, de seusseguidores e de sua fé.
É claro que ambas essas posturas são muito bem argumentadas em raciocínios bíblicos e teológicos, em interpretações e revelações, como também claro me parece que ambas, no final das contas,descumprem mandamentos explícitos de Jesus quanto a sermos, nós, seus discípulos, “sal e luz” para nossa geração, enquanto anunciamos o Reino de Deus a todos os povos, raças e nações, em todas as línguas e culturas, ainda que em meio a oposições, perseguições e martírios, até que Ele mande oArcanjo fazer soar a trombeta anunciando os últimos tempos e o Seu Dia.
Uma vez que não nos cabe a nós determinar a ocasião e a oportunidade da Vinda do Senhor, precisamos perseverar no testemunho do Seu Reino, no viver uma vida santa em meio a uma sociedade “corrompida e perversa”, e no diligente cumprimento da ordem de fazer discípulos, enquanto aqui estivermos, inclusive com o encargo de transmitir o que recebemos para as novas gerações de cristãos, habilitando-os a serem idôneos depositários, testemunhas e proclamadores para seus contemporâneos. Até que Ele venha ou daqui nos arrebate.
Nesse contexto, considero ser pertinente, e mesmo necessário, perguntar sobre a Igreja no século XXII e sobre como a Igreja do século XXI está sendo edificada, formada e capacitada para levar o Evangelho de Jesus para as pessoas desta geração e da próxima.
Sei que há alguns que creem honestamente que esta seja a última geração de homens sobre a Terra e que, assim, não consideram esses questionamentosrelevantes ou necessários. Sem me envolver em questões escatológicas, para as quais não me sinto qualificado, quero apenas destacar que o Senhor espera, na Sua Volta, encontrar a Sua Igreja não escondida e acovardada em guetos e cavernas de qualquer tipo, mas andando em Seus passos, servindo, testemunhando, amando seus contemporâneos, testemunhando a eles a vida de Jesus e proclamando com coragem, ousadia e fé o Evangelho como o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê. Não importa a que preço!
Penso que aqueles que, como eu, pertencemos à geração que está vivenciado a passagem do século XX para o século XXI, temos um especial encargo e dever de preparar nossos filhos e netos para a difícil jornada que a humanidade deverá enfrentar nas próximas décadas.
Nós tivemos, e ainda temos, a responsabilidade e o desafio de testemunhar e proclamar o Evangelho de Jesus num mundo em rápida transformação e em acelerada marcha em direção à negação de tudo o que relaciona a Deus e a Sua vontade, com o advento da chamada modernidade, com a disseminação do humanismo secular, do materialismo e dorelativismo, com a perda das noções de verdade, de justiça, de bem e mal, de certo e errado, assim como com a propagação de ideias e discursos que buscamse impor como consenso na construção de umasociedade secularizada, mundana, ímpia e sem propósitos eternos.
Assim, o dever de fazer perguntas queconfrontem este século à luz da verdade de Deus e de buscar discernir seus sofismas e enganos, está imposto a nós, os que hoje somos pessoas maduras, cidadãos experientes, profissionais, pais e mães, líderes, formadores e influenciadores dos mais jovens, referências na Igreja e na comunidade onde vivemos, assim como àqueles, de qualquer idade, que se sintam despertados por essas preocupações ou as estejam enfrentando em suas próprias vidas.
Diante disso, parece-me imprescindível enfrentar novamente as perguntas que nos desafiaram no final do século passado, sobre a existência, sobre a sociedade, sobre o mundo, sobre a natureza humana, sobre política, economia, ecologia, costumes, conhecimento, valores, verdade e justiça, e também sobre o propósito e sentido da vida, sobre o Cristianismo, sobre a Igreja, sobre nossa identidade e missão na nossa própria geração.
A não conformação com este século
Para não nos “conformarmos com este século” precisamos, a partir da revelação de Deus, conforme as Escrituras Sagradas, e com a iluminação do Espírito Santo, discernir quais são as fôrmas, os esquemas, os sofismas e as conformações de mente nas quais este mundo presente pretende e tenta todo o tempo e de todas as maneiras nos aprisionar, bem como quais são as vozes, os discursos, as estratégias e os agentes mobilizados para isso.
E, para alcançar esse entendimento, perguntas devem ser feitas. Perguntas que possam trazer à luz e denunciar os conceitos, valores, ideias, pensamentos, propósitos e sentidos escondidos nos discursos e reivindicações dos dominadores, influenciadores e gestores deste mundo, estejam eles na economia, na política, nas ciências, nas artes, nas famílias e círculos de relacionamento, nas redes sociais ou mesmo na religião e na Igreja.
Como cristãos, devemos, particularmente e com zelo, atentar para as infiltrações da mentalidade deste século na doutrina e na vida da Igreja.
Nesta virada de século testemunhamos, com tristeza e muita preocupação com as vidas envolvidas, o surgimento de uma quantidade de “teologias”, de “ministérios” e de movimentos váriosque não passam de meros e tacanhos simulacros das filosofias, ideologias e conceitos dominantes na sociedade, como se bastasse o uso de uma terminologia evangélica, ou “gospel”, destituída de significado e de essência, para justificar desvios evidentes da Palavra de Deus em questões que nela estão claramente tratadas, em mandamentos, doutrinas, princípios e fundamentos de fé.
Não falo aqui de legítimas diferenças de interpretação e aplicação de textos bíblicos que precisam ser entendidos em perspectiva temporal e cultural, mas de ensinos e abordagens que, quando vistos de perto e submetidos ao crivo de algumas perguntas referenciadas às verdades contidas nas Escrituras, revelam sua sujeição à sabedoria deste mundo, que não conhece nem pode conhecer a Deus, numa conformação aos conceitos, valores e modo de viver deste século em detrimento da verdade.
Depois da teologia liberal, que se rendeu aos métodos e pressupostos racionalistas das nascentes ciências humanistas no início do século passado, tivemos a teologia da libertação, que tentou impor uma leitura marxista das Escrituras, aprisionada à dialética do materialismo histórico, e após essas, tantas outras abordagens e interpretações, menos elaboradas, mas ainda mais populares, como a da prosperidade, do triunfalismo, do sucesso pessoal, da confissão positiva, da reprogramação mental, da gestão da alma, da governança dos pensamentos e sentimentos, da psicologização da fé, da terapeutização da santidade, da midiatilização dopastoreamento, para citar algumas.
Agora mesmo estamos às voltas, na trincheira da defesa da sã doutrina e das vidas de pessoas preciosas para Deus, com o enfrentamento das teologias chamadas inclusivas, que nada mais são do que uma simples capitulação e uma sujeição irrefletida aos pretensos “consensos” modernos sobre identidade de gênero e moral sexual.
Em todos esses casos, vemos uma parte da Igreja não apenas se conformando a este século, mas buscando dele aprovação e legitimação para sua própria existência e atuação na sociedade, chegando mesmo a reformular doutrinas e distorcer ensinos bíblicos claros sobre a verdade, sobre a vontade de Deus e sobre o padrão de santidade por Ele requerido.
Mais do que nunca, perguntas são necessárias!Perguntas sobre o ser humano, sua natureza, sua identidade pessoal, sobre a existência, sobre a verdade, sobre sentido e propósito das escolhas e decisões, sobre conhecimento, realidade, valores, ideologias, história, modernidade, estilos de vida, padrões de sucesso.
Perguntas que nos libertem dos aprisionamentos dos discursos que se apresentam como consensos, que nos livrem da tirania da “sabedoria” das redes sociais e das armadilhas e sofismas dos convencimentos simbólicos. Perguntas que nos lancem na jornada em busca de nosso significado, valor e relevância como seres pessoais, vocacionados para expressar a Imagem e a essência daquele que nos criou. Perguntas que devolvam a nós e a esta geração esperança.
A renovação da mente
Do mesmo modo, a renovação de mente, necessária e essencial para que sejamos transformados à Imagem d’Aquele que nos criou epara que possamos conhecer e amar Sua vontade, nos impõe a tarefa de meditar e refletir sobre a revelação de Deus nas Escrituras, sobre como podemos viver,comunicar Suas verdades e proclamar Sua glória e salvação para as pessoas que falam esse estranho idioma da modernidade e vivem em sua distorcida cultura, na qual também nós nascemos e de onde fomos um dia resgatados.
Não nos bastará nos refugiarmos no passado, longínquo ou recente. Precisamos reconhecer que muitas das coisas que ensinamos e o modo como as vivemos se tornaram nossas próprias tradições. Nãoservirá a nossos filhos e netos, nem às pessoas desta e da próxima geração, a reafirmação de respostas que, embora corretas e pertinentes a seu tempo, podem ter perdido a relevância por conta das profundas e céleres transformações por que passa a humanidade nesta virada de século.
Caso insistamos numa posturas defensiva, num conservadorismo covarde e irrefletido, nós, os reformadores e restauradores, os questionadores de outrora em busca de uma expressão verdadeira do Evangelho, inconformados que estávamos com “o fútil procedimento” que nos legaram nossos pais, nos tornaremos, para os jovens de agora, os legalistas, tradicionais, retrógrados e obscurantistas, e correremos o risco de vê-los rejeitar, juntamente com nossas defasadas respostas, o próprio cristianismo como fonte da revelação de Deus para cada pessoa em cada cultura e época. O que, desventuradamente, já está a acontecer em nossas congregações.
Preciso deixar claro aqui que quando falo em fazer perguntas e buscar respostas adequadas e coerentes com nosso tempo e cultura não estou a propor nenhuma revisão das verdades encontradasnas Escrituras quanto ao seu conteúdo e relevância para todos os homens. Meu propósito é o oposto disso.
É exatamente porque creio firmemente na verdade contida na Bíblia e na revelação proposicional de Deus que por meio dela recebemos, como único caminho de salvação, que defendo que a Igreja tenha a ousadia de, em sua geração, não se esquivar de quaisquer postulações e questionamentos que possam surgir como decorrência dos rumos que a humanidade tem assumido ao longo dos séculos, bem como do eventual enrijecimento de formas, linguagens e métodos de expressão existencial da vida da Igreja como comunidade histórica.
Mais ainda, penso ser necessário que nós cristãos assumamos o protagonismo e confrontemos nossos contemporâneos com as perguntas fundamentais da existência, a ver se os despertamos do entorpecimento e do obscurecimento de mente em que estão aprisionados, dentro e fora das congregações cristãs.
Nesse sentido, considero que seria muitíssimo oportuno reler os Atos dos Apóstolos, libertados das interpretações e das tradições, tanto as que rejeitamosno passado, quanto as que abraçamos em algum momento. Vemos ali que o Pentecostes, que marcou o derramamento do Espírito como a necessária capacitação para que a nascente Igreja iniciasse, publicamente, sua vida e missão, foi um megaevento de comunicação transcultural, com tradução simultânea em todas a línguas e idiomas, para alcançar pessoas de todos os lugares e culturas.“Ouvimos em nossa própria língua”, testemunharam aqueles que estavam lá. E foi em suas próprias línguas que levaram a seus países e nações a mensagem recebida para toda aquela geração.
A essência do Pentecostes não está nosobrenatural da manifestação de Deus, mas na comunicação da mensagem do Verbo eterno para todos os povos e culturas. Hoje vemos muitos na Igreja mais interessados em falar línguas “estranhas” (expressão, aliás, não bíblica!) do que em falar a linguagem de sua própria geração para lhes anunciar as grandezas de Deus e o Evangelho do Seu Reino.
A Palavra continua viva e eficaz, não está aprisionada em livros, tradições e culturas e precisa ser transmitida às pessoas desta geração, secularizada e ímpia, em sua própria linguagem e cultura, como verdade, como graça e como poder de Deus, relevante para todas as áreas e aspectos da existência humana.
Essa tarefa deve ser realizada por homens e mulheres que conhecem o Senhor e vivem a realidade do Reino, de modo a comunicar o propósito de Deuse proclamar Seu Reino, Sua glória, Suas verdades e valores, ao tempo em que enfrentam as mesmas circunstâncias e adversidades, os mesmos questionamentos e desafios que seus contemporâneos.
Assim, é imperioso, por amor ao Senhor e aos homens, e por obediência à ordem de Jesus, enfrentar novamente as perguntas que, há algumas décadas, nos levaram a repensar as tradições recebidas de nossos antepassados, assim como precisamos ter acoragem de assumirmos odres novos para o vinho sempre novo do Espírito.
Temos, muitas vezes, caído na falácia de nos acomodarmos com as “respostas certas” outrora encontradas, e de as transmitirmos como legados a nossos filhos naturais e espirituais, correndo o risco de tornar, por vezes, na prática, ensinos e costumes relativos como absolutos, sacralizando formas e métodos, eternizando lideranças humanas.
Respostas certas encontradas numa geração podem se tornar irrelevantes para a próxima pelo simples fato de que o mundo está em constante transformação e de que Deus está interessado em se comunicar com as pessoas de cada tempo presente em sua língua e cultura.
O que realmente temo é que nós, mais velhos, estejamos formando uma geração de filhos naturais e espirituais que “herdaram” a fé de seus pais, a qual agora lhes parece, diante dos dramas, questionamentos e conflitos da vida moderna, um conjunto de respostas antiquadas, impossíveis de serem vividas, incomunicáveis aos seus contemporâneos, insuficientes para dar conta das perguntas que os assombram. Respostas certas que, todavia, se tornaram irrelevantes.
Necessitamos, dramaticamente, de respostas certas, isto é, fundamentadas solidamente nas Escrituras, que sejam comunicadas de forma relevante e significativa para as pessoas deste tempo.
Incapazes de viver a fé num mundo estranho e em constante mudança, e de testemunharem para sua própria geração, não poucos desses mais jovens têmenfrentado, muitas sozinhos, crises de fé que os têm levado a abandonar o cristianismo como verdade de Deus, ou pelo menos como verdade capaz de efetivamente transformar e dar sentido a suas vidas.
Digo sozinhos porque, infelizmente, a Igreja tem se tornado, em muitos lugares, ambientes onde não se admite mais ouvir as perguntas que já foram respondidas pelos seus anciãos e líderes do passado.Em tal contexto, dificilmente se produzirão conversões genuínas.
A última coisa que desejo ao fazer essas considerações é complicar a fé de quem quer que seja. Não pretendo trazer dúvidas e inquietações àqueles que estão em paz com suas vidas e com o seu serviço a Deus. Tampouco quero sugerir ou estimular qualquer tipo de insurreição contra autoridades e lideranças.
Minha intenção é despertar e dar voz àqueles irmãos e irmãs, líderes e pastores, pais e mães que têm se preocupado com o estado e o futuro espiritual de seus filhos e dos discípulos com quem se relacionam, bem como com a proclamação do Reino de Deus para todas as pessoas em todos os lugares.Quero também oferecer espaço, coração e ouvidos aos mais jovens que sofrem dia após dia os confrontos e assédios deste século.
Queridos irmãos e irmãs, não pode haver renovação de mente se não tivermos a coragem e a humildade imprescindíveis para ouvir de novo, dos nossos filhos, filhas, netos e netas, dos jovens desta geração, de dentro e de fora da Igreja, as perguntas que nos assombravam ( e a mim ainda me assombram) quando estávamos à procura da verdade e de sentido para nossa vida.
Por mais temor que isso possa nos causar, devemos nos lembrar que foram essas as perguntas que um dia nos levaram ao Pai. Há esperança nesse caminho. Mas não consigo ter esperança na mudez dos jovens provocada pela surdez dos velhos.
Não tenho o direito de responder a uma pergunta se não me permitir ser honestamente mais uma vez confrontado por ela, se não puder me identificar com a dúvida e o temor que ela gera no coração de alguém que se encontra em trevas em busca de verdade e de salvação.
Mesmo porque, como escrevi há muito tempo, em outro lugar, creio que há perguntas que não buscam principalmente respostas, mas, sim, procuramcompanhia para atravessar o deserto de silêncio que elas provocam. Com a Graça do Senhor, encontraremos sempre, nesse deserto, vereda até Ele,e aquietaremos em Sua presença nossos pensamentose corações.
...
Para dar substância e consequência a essas preocupações, quero apresentar um esboço, provisório e sugestivo, de quais seriam algumas dessas perguntas a que me refiro, capazes de nos levar a uma não conformação com este século, a uma renovação de mente e a uma vida e proclamação do Evangelho que glorifiquem a Deus nesta geração.
Essas perguntas poderiam ser propostas em três grandes grupos, abertos e em construção: perguntas sobre a mentalidade deste século; perguntas sobre a expressão da Igreja nesta geração; e perguntas sobre nossa particular experiência como comunidade de discípulos.
Essas são as perguntas fundamentais da existência humana, que, ao longo dos milênios, despertaram as pessoas para a busca de verdade, se sentido, de valor e de significado.
Quem somos nós? De onde viemos? Qual o propósito de nossa vida? O que é verdadeiro? O que é justo? O que é bom? Exitse o transcendente, eterno?Que é perfeito, belo? Etc.
A Igreja tem se expressado nesta geração como comunidade do povo de Deus, testemunhando Seu caráter e vontade e proclamando Sua salvação em todas as línguas e culturas?
Temos sido coerentes com o mandamento de Jesus e o testemunho dos Atos dos Apóstolos no sentido de viver e pregar o Evangelho por toda parte, ou temos nosescondido em guetos, fugido das confrontações eaprisionado a mensagem da salvação em lugares, formas e grupos?
As pessoas desta geração têm visto o amor como a marca distintiva dos discípulos de Jesus? Tem sido impactadas por pessoas, famílias e comunidades onde fluem a vida e a Presença de Deus?
O modo como trabalhamos, estudamos, vivemos, enfrentamos as dificuldades, nos divertimos, somos criativos, nos expressamos revelam que nos movemos por um propósito eterno? Etc
O quanto de nossas definições, formas, ensinos, métodos e direções se tornou inadequado e defasado para os jovens desta geração, senão em seu conteúdo, mas em sua linguagem e abordagem? Quantos relativos temos tornado absolutos? Etc.
Quando nos propomos a fazer perguntas em busca de respostas, uma disposição de coração é absolutamente necessária. Sem ela podemos facilmente nos perder em nossas próprias ideias, convicções, medos e fantasias, caindo nos mesmos erros que começamos por denunciar. Refiro-me à humildade, sem a qual é absolutamente impossível aprender ou receber qualquer coisa de Deus. Foi a soberba que nos afastou do conhecimento do Altíssimo desde nossos primeiros pais e é ela que tem mantido gerações de homens em rebelião contra Ele.
Não podemos jamais pretender ter respostas que não levem nossos pensamentos cativos a Cristo, assim como não podemos ter a pretensão de tudo entender, de em tudo termos definições e direções claras absolutas. Imperfeitamente conhecemos e imperfeitamente profetizamos, escreveu o Apóstolo. De outro modo, logo passaremos a depender de nossa sabedoria e entendimento, e não do próprio Deus.
Para muitos dramas e perplexidades da vida vivida não encontraremos propriamente respostas, no sentido de conseguirmos identificar causas, dar explicações, oferecer razões e apresentar justificativas. Sofrimentos, dores, perdas e injustiças muitas vezes nos fazem calar.Perguntas sobre o infinito, sobre o eterno, sobre os homens e sobre nós mesmos nos enchem de perplexidades.
Deus mesmo, Sua Infinita e Perfeita Pessoa, é um mistério profundo que nós, limitadas criaturas, apenas podemos contemplar e adorar. Nunca poderemos entender a totalidade d’Ele. Mesmo Sua revelação na encarnação do Filho foge à nossa total compreensão. Passaremos a eternidade crescendo nesse conhecimento.
Permito-me encerrar esse texto com dois poemas que escrevi algum tempo atrás, nos quais tento expressar essa percepção de que Deus, muitas vezes, nos responde apenas com Sua Presença silenciosa. E ela é mais do que suficiente.
Amados, companheiros de jornada, que a suficiente graça de Jesus nos conduza e nos guarde nesta geração e até que Ele venha.
Seu conservo,
Fernando
Presença
só em Deus meus pensamentos
se aquietam,
se não em respostas,
mas na Presença
o silêncio de Deus
é poderoso
como as entranhas do universo
pleno e fecundo
como as colisões galácticas
é o prelúdio da criação
a aurora dos tempos
uma pausa entre os mundos
que foram
e os que hão de ser ...
(De “Versos Exilados”, 2008 AD)
Teologia do Invisível
“He may well be loved, butnot thought”
Anonymous, The Cloud ofUnknowing
Deus é meu encontro no fim de tudo
O oceano dos meus rios sinuosos
O céu dos meus voos incertos
O destino dos meus passos errantes
A manhã das minhas noites febris
Deus é o dono
Do altar vazio das minhas perguntas
Sem respostas
Onde ofereço o sacrifício silencioso
Das minhas perplexidades
Não consigo discerni-lo
No denso nevoeiro de minha ignorância
Não posso vê-lo, ofuscado pelo resplendor
Da sua glória
Mas Ele permite que o amando
Eu o conheça
Na clareza do seu próprio amor
No reflexo da sua glória
(De “Invisibilidade”, 2009, AD)
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