domingo, 6 de agosto de 2017

A Voz no Monte Santo


Naquele tempo, Jesus tomou consigo Pedro, Tiago e João, seu irmão, e levou-os, em particular, a um alto monte
e transfigurou-Se diante deles: o seu rosto ficou resplandecente como o sol, e as suas vestes tornaram-se brancas como a luz.
E apareceram Moisés e Elias a falar com Ele.
Pedro disse a Jesus: «Senhor, como é bom estarmos aqui! Se quiseres, farei aqui três tendas: uma para Ti, outra para Moisés e outra para Elias».
Ainda ele falava, quando uma nuvem luminosa os cobriu com a sua sombra, e da nuvem uma voz dizia: «Este é o meu Filho muito amado, no qual pus toda a minha complacência. Escutai-O».
Ao ouvirem estas palavras, os discípulos caíram de rosto por terra e assustaram-se muito.
Então Jesus aproximou-Se e, tocando-os, disse: «Levantai-vos e não temais».
Erguendo os olhos, eles não viram mais ninguém, senão Jesus.
Ao descerem do monte, Jesus deu-lhes esta ordem: «Não conteis a ninguém esta visão, até o Filho do homem ressuscitar dos mortos». 
Mateus 17,1-9.

Comentário: Santo Agostinho 
(354-430), bispo de Hipona (norte de África), doutor da Igreja 
Sermão 78 


«Nós ouvimos essa voz, que Lhe foi dirigida lá do Céu, quando estávamos com Ele no monte santo» (2Pd 1,18)


«Senhor, como é bom estarmos aqui!» Cansado de viver no meio da multidão, Pedro acabava de encontrar a solidão no alto do monte, onde a alma se alimenta de Cristo. Porque haveria de deixar aquele local e de voltar às fadigas e aos sofrimentos, ele que ardia de um amor santo por Deus e dessa maneira santificava a sua vida? Pedro queria aquela felicidade, embora tivesse acrescentado: «Se quiseres, farei aqui três tendas: uma para Ti, outra para Moisés e outra para Elias». [...]

Pedro desejava três tendas; a resposta vinda do Céu demonstrou que só temos uma: o Verbo de Deus é o Cristo, o Verbo de Deus está na Lei, o Verbo de Deus está nos profetas. [...] Quando a nuvem os envolveu a todos, e formou, por assim dizer, uma única tenda sobre eles, dela saiu uma voz. [...] Aquele que a voz revelava é o mesmo em quem a Lei e os profetas se gloriavam: «Este é o meu Filho muito amado, no qual pus toda a minha complacência. Escutai-O». Porque O escutastes nos profetas, O escutastes na Lei, e onde foi que não O ouvistes? A estas palavras, os discípulos caíram por terra. [...]

Ao caírem por terra, os apóstolos simbolizam a nossa morte [...], mas, ao erguê-los, o Senhor simboliza a ressurreição. E, depois da ressurreição, de que serve a Lei? De que serve a profecia? A partir desse momento, Elias e Moisés desaparecem. O que resta é: «No princípio era o Verbo, e o Verbo estava em Deus, e o Verbo era Deus» (Jo 1,1). Resta-te o Verbo, para que Deus seja tudo em todos (1Cor 15,28). [...]

Desce, Pedro. Tu desejavas descansar no monte [...] e eis que o próprio Senhor te diz: «Desce para sofreres e servires neste mundo, para seres desprezado e crucificado neste mundo. A vida desceu para ser levada à morte, o pão desceu para suportar a fome; o caminho desceu para se cansar caminhando, a fonte desceu para suportar a sede, e tu recusas-te a sofrer? Não procures o teu proveito. Pratica a caridade, anuncia a verdade. Alcançarás, então, a imortalidade, e, com ela, encontrarás a paz.»

Fonte: Evangelho quotidiano.org

sábado, 5 de agosto de 2017

Sobre a Misericórdia de Deus

MISERICÓDIA
Thomas Merton

            Quão mais perto Deus está de nós quando reconhecemos nossa vileza e lançamos sobre Ele todo o nosso cuidado! Contra todas as expectativas humanas, ele nos sustenta quando precisamos ser sustentados e nos ajuda a fazer o que parecia impossível. Apendemos a conhecê-lO, agora não na “presença” que se encontra em considerações abstratas, a “presença” em que O revestimos com nossas próprias fantasias, mas no vazio de uma esperança que pode se aproximar do desespero. Pois a perfeita esperança é alcançada no limiar do desespero, quando, ao invés de cair no abismo, nos descobrimos andando no ar. A esperança está sempre na iminência de se tornar desespero, mas nunca o faz, pois no momento da suprema crise o poder de Deus é subitamente tornado perfeito na nossa debilidade. Então, aprendemos a esperar na Sua misericórdia tão mais calmamente quanto maior for o perigo, a procurá-lO tranquilamente diante da ameaça, certos de que Ele não pode nos faltar, ainda que sejamos abandonados pelos justos e rejeitados por aqueles que alegam deter a evidência do Seu amor.
            Cum vero infirmor, tunc potens sum. “Quando sou fraco, então é que sou forte (2a aos Coríntios 12:10).
            Nossas fraquezas abriram os Ceús para nós porque elas trouxeram até nós a misericórdia de Deus e nos atraíram o Seu amor. Nossa infelicidade é a semente de toda a nossa alegria.
            ...
            O conceito cristão de misericórdia é, assim, a chave para a transformação de todo um universo onde o pecado ainda parece reinar. Pois o cristão não escapa do mal, não está dispensado do sofrimento e não está livre da influência e dos efeitos do pecado: ele não está isento de pecar. Infelizmente, ele também pode pecar. No entanto, sua vocação é livrar o mundo inteiro do pecado e transformá-lo em Deus: por meio da oração, da penitência, da caridade e, acima de tudo, da misericórdia. Deus, que é todo santo, não apenas teve misericórdia de nós, mas Ele entregou Sua misericórdia nas mãos de potenciais pecadores para que eles possam escolher entre o bem e o mal, e possam vencer o mal como bem e obter misericórdia para suas próprias almas tendo misericórdia dos outros.
            Deus deixou o pecado no mundo para que pudesse haver perdão: não apenas o perdão secreto pelo qual Ele mesmo purifica nossas almas, mas o perdão manifestado pelo qual nós temos misericórdia uns dos outros e, dessa forma, damos expressão ao fato de que Ele vive, por Sua misericórdia, nos nossos corações.


De “Homem algum é uma ilha”.

Tradução de Fernando Saboia Vieira.