terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

A Fé e a Noite Escura da Alma

Marcos 8,14-21.
Os discípulos tinham-se esquecido de levar pães e só traziam um pão no
barco.
Jesus começou a avisá-los, dizendo: «Olhai: tomai cuidado com o fermento
dos fariseus e com o fermento de Herodes.»
E eles discorriam entre si: «Não temos pão.»
Mas Ele, percebendo-o, disse: «Porque estais a discorrer que não tendes
pão? Ainda não entendestes nem compreendestes? Tendes o vosso coração
endurecido?
Tendes olhos e não vedes, tendes ouvidos e não ouvis? E não vos lembrais
de quantos cestos cheios de pedaços recolhestes, quando parti os cinco pães
para aqueles cinco mil?» Responderam: «Doze.»
«E quando parti os sete pães para os quatro mil, quantos cestos cheios de
bocados recolhestes?» Responderam: «Sete.»
Disse-lhes então: «Ainda não compreendeis?»

Da Bíblia Sagrada

Comentário ao Evangelho do dia feito por
São João da Cruz (1542-1591), carmelita, Doutor da Igreja
A Subida ao Monte Carmelo, II, 3 (a partir da trad. OC, Cerf 1990, p. 637 rev.)


«Não vedes? Ainda não compreendeis?»

Dizem os teólogos que a fé é um hábito da alma ao mesmo tempo seguro e
obscuro. E é obscuro porque nos propõe verdades reveladas sobre o próprio
Deus que ultrapassam qualquer luz natural e excedem toda a compreensão
humana, seja ela qual for. Daí decorre que a luz excessiva dada pela fé se
transforma para a alma em profundas trevas. Como sabemos, qualquer força
superior supera e enfraquece uma que lhe seja inferior; desse modo, o sol
eclipsa todas as luzes restantes, ao ponto de, quando ele resplandece,
todas as outras não parecerem propriamente luzes. Para além do mais, quando
está no zénite, o seu brilho ultrapassa por completo a nossa capacidade
visual até nos ofuscar em vez de nos fazer ver, devido a tornar-se
excessivo e desproporcionado à nossa visão. O mesmo se passa com a luz da
fé, que pelo seu prodigioso excesso abate e enfraquece a luz do
intelecto.


Tomemos outro exemplo: suponhamos uma pessoa cega de nascença que, por isso
mesmo, não conhece as cores. Ao esforçarmo-nos por fazer-lhe compreender o
branco ou o amarelo, bem podemos dar explicação atrás de explicação que ela
não retirará delas qualquer conhecimento directo, porque nunca viu as
cores, cujo nome será a única coisa que ela reterá no espírito, através do
ouvido. O mesmo se passa com a fé em relação à alma: a fé diz-nos coisas
que nunca vimos nem conhecemos e a respeito das quais não possuímos a mais
pequena réstia de conhecimento natural, mas retemo-las através do ouvido,
crendo no que nos é ensinado e ofuscando em nós a luz natural. Com efeito,
como nos diz São Paulo, «a fé surge da pregação» (Rom 10, 17). É como se
ele nos dissesse: a fé não é uma ciência que reconhecemos pelos sentidos,
mas um consentimento da alma que entra em nós pelo ouvido. Torna-se então
evidente que a fé é para a alma uma noite escuríssima, mas é precisamente
com a sua escuridão que ela ilumina: quanto mais a mergulha nas trevas,
mais lhe faz brilhar a sua luz. Assim sendo, é ofuscando que ela alumia,
segundo as palavras de Isaías: «se não acreditardes, não compreendereis»
(7, 9).


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