quinta-feira, 29 de março de 2012

Graça

minha voz
               diluída
num mar de vozes
uníssonas


meu rosto sem
                      contornos
numa multidão de rostos
transfigurados


minha vida tão
                     comum
entre tantas vidas
singulares


graça
é ser achado único
na multidão de iguais,
é ser igual
num universo
de seres únicos


é ser chamado pelo nome
escolhido de onde estava
aceito assim mesmo


Fernando Sabóia, de "Veredas no Deserto"

quinta-feira, 1 de março de 2012

As Fontes Interiores

Caros,

Estou publicando aqui o esboço da palavra que compartilhei no retiro de fevereiro. Pretendo, oportunamente, dar texto a esses pensamentos. Por agora, ficam essas anotações, incompletas e algo diferente, talvez, da versão em viva voz.

O QUE FLUI DO SEU INTERIOR?

 Fernando Sabóia, Alexânia – Brasília, fevereiro de 2012, AD

JOÃO 4:13-14
JOÃO 7:37-39

  1. A vida que Jesus os oferece, a fonte que jorra para a vida eterna, os rios de água viva que fluem do interior – o Espírito Santo, a verdadeira adoração.

  1. Águas empoçadas, águas de cisternas, poços profundos:

- águas empoçadas: não são próprias para o consumo, têm evaporação rápida;
- águas de cisternas: dependentes do regime de chuvas, nem sempre puras, facilmente poluídas ou obstruídas.
- águas de poços profundos: jorram, abundantes, limpas, frescas, perenes.

  1. Jesus fala de um enchimento de “dentro para fora”, um fluir do interior, um jorrar para fora. O enchimento de “fora para dentro” está relacionamento com a capacitação do Espírito Santo para a obra, o enchimento de “dentro para fora” diz respeito à transformação íntima produzida pela habitação de Deus em nós pelo Espírito. O primeiro é passageiro, o segundo é eterno.

  1. O que flui do seu interior? Quando tudo está em silêncio, o que você ouve dentro de você? Quando não tem nenhuma necessidade, o que deseja? Quando é pressionado, provocado, como reage? O que vem do seu coração, fontes de vida ou de morte? Uma voz que convida à comunhão com Deus ou que induz ao pecado?

- Mateus 15:1-20
- Provérbios 4:23
- Salmo 27:8

  1. Do seu interior

Flui PAZ, CONFIANÇA, AMOR, ALEGRIA, CONTENTAMENTO, CORAGEM?
Ou
ANSIEDADE, MEDO, TRISTEZA, PESSIMISMO?

      Flui AMABILIDADE, BENIGNIDADE, BONDADE, PACIÊNCIA, TERNOS AFETOS?
      Ou
      IMPACIÊNCIA, IRRITABILIDADE, GROSSERIA, AMARGURA, INVEJA?

      Flui PUREZA E SANTIDADE ou flui IMPUREZA E PECADO?

  1. A pergunta pelo que flui de dentro de você não é uma pergunta pelo o que você é naturalmente. Sabemos que, por natureza, somos maus e corrompidos, mas se já bebemos da água que Jesus dá, se cremos nEle, temos dentro de nós fontes, rios de águas vivas a jorrar. O poder do Espírito que habita em nós é maior do que o poder do pecado. Essa é a vitória de Jesus.

  1. Essa operação interior do Espírito Santo dentro de nós deve ser nossa experiência mais profunda e mais transformadora. Ele quer comunicar Sua vida e Seu caráter, quer transformar nossos pensamentos, sentimentos, vontades, valores, tudo o que há em nós. Não apenas nossos comportamentos externos.

  1. Mas qual tem sido o nível de sua experiência com Deus?

- como águas empoçadas, formadas por chuvas passageira, poluídas com a terra, enlameadas?
- águas de cisternas, ora puras, ora barrentas, ora doces, ora margas, ora abundantes ora escassas?
- o que tem impedido você de ser pleno desse fluir de Deus?
- como buscar essa vida interior com Deus?
- como desobstruir essas fontes interiores para que as águas vivas possam jorrar?

  1.  Será que não temos ficado no nível dos comportamentos externos, das palavras pronunciadas e das atividades e não estamos deixando o Senhor nos tocar e transformar mais profundamente, em nossas intenções, vontades, pensamentos, caráter? Ficamos na superfície do que fazemos e não vamos ao âmago do que somos e do que devemos ser em Cristo?

  1.  Na essência do propósito eterno de Deus está a regeneração do homem, uma nova humanidade com novo coração, nova mentalidade, novo pensar, novo sentir, novo querer, novo compreender.



  1. O projeto de Deus não é os tornar pessoas melhores, mas NOVAS CRIATURAS. Não é superficial, não é apenas exterior, não natural. É profundo, interior e sobrenatural – é espiritual. O ser pleno que Ele criou em Adão foi corrompido pelo pecado e restaurado plenamente em Jesus.

  1. Isso implica não “apenas” cura, libertação e restauração, mas MUITO MAIS AINDA – uma nova maneira de ser e de existir, uma nova dinâmica de vida psicológica, emocional, intelectual, afetiva, completamente transformada pela Presença guiadora, reveladora, iluminadora do Espírito Santo.

  1. O que é necessário para isso? Uma resposta inicial podemos já indicar dos seguintes textos do Evangelho de João:

- João 4:13-13 – pedir
- João 7:37-39 – crer
- João 14:21 – amar a Jesus e obedecer
- João 17:7-12 – permanecer em Jesus, na palavra, nos mandamentos e no amor uns aos outros.


SUPERFICIAIS OU PROFUNDOS COM DEUS?


Jeremias 2:13
Isaías 29:13-16
Isaías 57:14-21
Salmo 51
Salmo 25:14
Salmo 131
Provérbios 3:34


1.      Atitudes que atraem Deus PARA DENTRO DE NÓS e atitudes que mantêm Deus DISTANTE DE NÓS:

. Sinceridade – Hipocrisia
. Quebrantamento – Altivez
. Humildade – Orgulho
. Fé – Incredulidade
. Confiança – Independência

Lucas 18:9-14 – o fariseu e o publicano

“Todos os meus problemas começam com meu orgulho e só terminam quando me humilho” FSV

2.      Vivemos uma geração de imagens, mídias, sons, cores, luzes, gostos, sensações, preferências, perfis virtuais. Uma sociedade marcadamente sensual e hedonista, mercadológica, altiva, independente, confiante em si mesma, em suas técnicas e em suas soluções.

3.      Por isso mesmo uma geração marcada pela superficialidade, pela efemeridade, pela falta de sentido, de significado e de identidade. Estamos construindo uma sociedade inabitável para seres humanos:

. Tecnologias e máquinas desumanas – tudo rápido demais, informações demais, exposição demais, aparências demais.
. Relacionamentos efêmeros, fúteis, precários.
. Valores inexistentes, desestruturação do mundo pessoal e interior.
. Projetos de vida não humanos, focados no sucesso, na prosperidade material, na juventude e beleza eternas.

4.      Há hoje um verdadeiro pânico da solitude e do silêncio. As pessoas estão sempre preenchendo seus sentidos com sons, imagens, conversas rasas pelo celular, internet, redes sociais etc. Não há espaço para reflexão, meditação, contatos pessoais significativos conosco mesmos, com os outros e com Deus.

5.      Criamos códigos, meios e padrões de comportamento que refletem nosso dilema entre o desejo e a necessidade que temos de relacionamentos pessoais, de um lado, e o medo da rejeição e do vazio, de outro.

6.      Essa superficialidade, efemeridade e artificialidade produz a perda de IDENTIDADE, de VALOR e de SENTIDO PESSOAL, sendo essa a causa profunda de nossas modernas enfermidades individuais e sociais.

7.      IDENTIDADE, VALOR e SENTIDO PESSOAL (SIGNIFICADO) só se estabelecem no íntimo, na essência de quem somos. Lá descobrimos a crueza do nosso pecado (Salmo 51), mas também é lá que o Espírito Santo transmite nossa verdadeira IDENTIDADE DE FILHOS, o AMOR DO PAI, que nos dá valor como pessoa, sua NATUREZA DIVINA e seu PROPÓSITO ETERNO que nos dão SENTIDO E SIGNIFICADO (Romanos 5:5, 8:11-17, 26-30).

8.      Essa identidade é essencialmente positiva. Deus está menos interessado nas coisas que temos que negar e renunciar do que naquilo que Ele quer gerar e produzir em nós. A morte na cruz só faz sentido na aurora da ressurreição.

9.      Quando oramos, adoramos, servimos, falamos, fazemos a obra, ouvimos e anunciamos a Palavra não podemos perder a consciência de que o Senhor quer nos transformar profundamente. Ele não quer mudar apenas nossos comportamentos, palavras e ideias. Ele quer nos dar uma NOVA MENTE, um NOVO CORAÇÃO, um NOVO PENSAR, SENTIR, QUERER, NOVOS AFETOS e PERCEPÇÕES – uma natureza divina.

10.  Nós, muitas vezes, tentamos “resolver a vida” nos níveis mais superficiais, mudando circunstâncias, comportamentos, discursos. Mas não é suficiente. Sabemos disso. Permanecemos vazios e distantes, ausentes. Apenas substituímos a agitação superficial do mundo por outra, que nos parece mais “espiritual”, mas que é, de fato, a mesma, porque focada em nós mesmos, e não em Deus.

11.  Temos ser MAIS PROFUNDOS com o Senhor: é do INTERIOR que fluem os rios do Espírito Santo, é lá que Ele atua profundamente no nosso ser comunicando a vida de Jesus e a natureza de Deus.

12.  Podemos pensar nessa atuação do Espírito em três níveis:

. O que eu faço, falo e sinto;
. O que eu sou;
. O que Jesus é em mim e eu sou nEle.

Por exemplo:

Posso dizer “eu menti” e tentar resolver tudo confessando e reparando o meu ato. No entanto, indo mais fundo, o Espírito me mostra que eu não apenas menti, mas que eu “sou” um mentiroso, que é algo entranhado no meu caráter. Buscando as fontes mais profundas de Deus em minha vida, encontro que Jesus, Ele é a Verdade e que Ele vive em mim. A verdade vive em mim pelo Espírito da verdade.  Assim, em Cristo, eu sou verdadeiro.

13.  Lutamos muito por nossa santificação de “fora para dentro”, pela obediência, disciplina e sujeição para formar hábitos e procedimentos santos.
Esse movimento é IMPRESCINDÍVEL, mas NÃO É SUFICENTE!
Precisamos, igualmente, aprender a buscar a operação do poder de Deus que age de “DENTRO PARA FORA” – Efésios 3:14-21
O Espírito Santo nos transmite e comunica SOBRENATURALMENTE Sua natureza, virtude, santidade e poder.


14.  É por meio do Espírito Santo habitando dentro de nós que o Reino aí se instala (Lucas 17:20-21).
Ele provoca em nós o ciclo vivificador e renovador descrito por Paulo em 2ª aos Coríntios 4:16-18.
Ele nos torna “homens espirituais” (1ª aos Coríntios 2:12-16).

15.  Em Lucas 13:22 Jesus menciona uma multidão de pessoas que mantiveram um relacionamento superficial com Ele. O conheciam de nome, de ouvir falar, de ver pelas praças, mas nunca se relacionaram de fato com Ele. Hoje há muitos assim. Adicionam Jesus no “Face”, O seguem no “Twitter”, “retuítam” Suas palavras, “curtem” suas “postagens”, são amigos dos seus amigos, mas não têm compromisso com Ele.
Esses poderão ser muito surpreendidos no Dia do Senhor!


EM BUSCA DAS FONTES INTERIORES


Usando a analogia com as águas, podemos pensar em três níveis de profundidade em nosso relacionamento com Deus, comparando com águas empoçadas, águas de cisternas e águas profundas.

ÁGUAS EMPOÇADAS

São águas acumuladas pelas chuvas. São rasas, poluídas, de rápida evaporação.
Nesse nível, pensamos em nossas atitudes exteriores, nossos comportamentos, nossos pensamentos, nossas palavras e nos nossos sentimentos e paixões naturais.
Podemos representar esse nível por frases como: “eu menti”, “eu me irei”, “eu invejei”, “eu pratiquei impureza”, “eu cobicei” etc.
Muitas vezes tentamos nos restringir a consertar nossas ações exteriores, confessando pontualmente os pecados evidentes e procurando mudar nosso comportamento, palavras etc.
Sem dúvida esses passos são necessários, mas o Espírito quer nos levar a um nível mais profundo de transformação.


ÁGUAS DE CISTERNAS

Essas são águas acumuladas em reservatórios também alimentados pelo regime de chuvas. Às vezes são abundantes, às vezes escassas. Num momento estão limpas, no outro podem estar poluídas.
Aqui estamos considerando nossas atitudes interiores, nossas convicções, compromissos e decisões – os valores, crenças e características que definem quem nós somos.
Quando chegamos a esse nível de profundidade com o Espírito Santo, dizemos: “eu sou mentiroso”, “eu sou iracundo”, “eu sou invejoso”, “eu sou impuro”, “eu sou cobiçoso” etc.
Esse é o mundo inconstante e muitas vezes contraditório da alma humana, capaz de abrigar sentimentos e valores elevados, mas também de se encher de vilania e de maldades.
Se esse fosse o ponto final da nossa jornada espiritual estaríamos em completo desespero. Mas não é assim! O Espírito Santo que habita em nós quer nos conduzir ainda mais para dentro, para mais fundo, até nos fazer encontrar os mananciais abundantes, os rios profundos que brotam do nosso interior, se já experimentamos a “água viva” que Jesus oferece e se cremos nEle.


ÁGUAS PROFUNDAS

            Essas fontes profundas estão em Cristo, em Sua vida em nós. D’Ele, que em nós habita, fluem os rios de água viva. Quando chegamos a esse nível, experimentamos o contentamento, a adoração, a intimidade com Ele.
            Agora dizemos: “Ele é a Verdade”, “Ele é manso”, “Ele é amor”, “Ele é santo” etc. Assim, podemos fazer a sequência: “eu minto”, “eu sou mentiroso”, mas “Ele é a Verdade” e Ele habita em mim e nEle eu sou verdadeiro. E, do meu interior, passa a fluir não a minha mentira, mas a Sua verdade.


AS PERFURATRIZES DE DEUS

            Nem sempre é fácil atingir os níveis mais profundos de espiritualidade. Á medida em que buscamos ser mais verdadeiros e mais íntimos de Deus podemos encontrar “solos rochosos” em nosso interior, difíceis de serem perfurados.   Esse é um trabalho do Espírito Santo em cada um de nós no qual Ele leva em consideração quem somos, nossa história pessoal, nossas fraquezas e debilidades.
            Podemos, no entanto, identificar alguns caminhos frequentemente usados por Deus para nos levar para mais perto do Seu propósito de nos fazer semelhantes a Jesus.


1)      O ministério do Espírito Santo e da Palavra, que nos levam à REVELAÇÃO do nosso pecado e de quem somos, à CONFISSÃO, necessária para o perdão e cura, à PROCLAMAÇÃO de quem Jesus é e de Sua obra na cruz, que gera fé e poder para a transformação de quem somos em quem Ele é, e à ADORAÇÃO, que faz fluir a vida espiritual por todo nosso ser e toda nossa existência.
2)      As disciplinas da ORAÇÃO, MEDITAÇÃO e CONTEMPLAÇÃO, que nos dão um acesso direto às fontes espirituais interiores e nos transformam (2ª aos Coríntios 3:12-18).

3)      A FÉ e OBEDIÊNCIA, indispensáveis para qualquer relacionamento e ação de Deus em nossas vidas e que abrem espaços para a ação do Espirito Santo.

4)      A busca da SANTIDADE PESSOAL e a VIDA DE SERVIÇO, que nos revelam o caráter e aprofundam a experiência com o Senhor.

5)      Os RELACIONAMENTOS, que nos levam a praticar as virtudes de Jesus e nos confrontam com nosso egoísmo.

6)      O AMOR A DEUS E AO PRÓXIMO, o caminho sobremodo elevado, fruto final de toda obra do Senhor em nós.



            Fernando Sabóia, Alexânia/Brasília, fevereiro de 2012, AD.