Caros, prossigo com a publicação de partes do livro "Uma Jornada em Busca da Vida Interior", a ser publicado e forma impressa.
2) A vida interior segundo as Escrituras
Por toda a Bíblia encontramos a declaração de que o relacionamento do homem com Deus deve incluir a pessoa inteira, a partir de seu íntimo, os seus pensamentos, conceitos, valores, sentimentos, motivações e vontades, e não apenas suas palavras e atos exteriores.
Os homens e mulheres aprovados por Deus eram os “retos de coração”, “íntegros”, “justos”, no pensar, no falar e no agir. Manifestavam uma inteireza, uma coerência entre o que eram interiormente e o que expressavam exteriormente, certa qualidade de alma e de espírito em tudo o que sentiam, desejavam, diziam ou faziam.
É também patente nas Escrituras que a fonte de vida e de santidade flui a partir de uma operação direta de Deus na natureza humana, produzida no seu interior, em sua alma e espírito, e não da observância formal, exterior, de rituais e mandamentos.
Esse processo atua em direção à plenitude da existência e da pessoa humana pela experiência da vida de Jesus dentro de cada um. Esse era o mistério outrora oculto revelado no Evangelho.
Os textos seguintes podem dar um panorama sobre a precedência e importância da vida interior para uma espiritualidade autêntica e frutífera, isto é, para uma vida humana válida, plena, abundante e eterna. Alguns deles serão tratados adiante com mais detalhes, mas, nesse passo, é importante mencioná-los juntos, ainda que brevemente.
a) Salmo 51:6, 10; Provérbios 4:23; Jeremias 9:23-24
O Senhor não se agrada com exterioridades ilusórias, mas com a verdade no íntimo daquele que o busca. Isso foi compreendido claramente pelos profetas e homens de Deus desde o Velho Testamento. A Bíblia de Jerusalém traduz “eis que amas a verdade no fundo do ser” (Salmo 51:6).
Davi teve a clara revelação do que Deus queria dele: “cria em mim um coração puro e um espírito inabalável”(Salmo 51:10). Ele sentiu necessidade de uma profunda transformação interior, algo que somente o Senhor mesmo poderia produzir, criar a partir do nada.
Do coração procedem as fontes da vida, o fluir da nossa existência, a energia que nos mantém vivos (Provérbios 4:23). Nosso sustento e vitalidade estão intimamente ligados ao nosso mundo interior, não apenas ao nosso corpo físico. Se nosso coração estiver guardado em Deus, dele fluirá vida, caso contrário, contaminação e morte.
A finalidade última da vida do homem não está nos aspectos externos de inteligência, riqueza ou poder, mas no conhecimento pessoal de Deus, na união com Ele (Jeremias 9:23-24).
b) Salmo 19:14; 2o Crônicas 16:9
Temos que buscar agradar a Deus não apenas com nossas palavras, mas também com o “meditar do coração”, com nosso diálogo íntimo e constante com Ele, que conhece todos os nossos segredos (Salmo 19:14).
É preciso que nossos pensamentos mais íntimos sejam transparentes e agradáveis a Deus, em cuja presença nós estamos.
O Senhor requer que o coração do homem se volte completamente para Ele, pertença totalmente a Ele. Essa é a condição para um relacionamento pleno com Ele, para a manifestação de seu poder e graça (2º Crônicas 16:9).
c) João 4:13-14; 7:37-39; 14:23
A verdadeira adoração não está ligada a um local ou rito, a exterioridades, mas a um conhecimento e relacionamento pessoal e íntimo com Deus – é “em espírito”.
Muitas vezes confundimos elementos exteriores que dão suporte e contexto à adoração – os ajuntamentos, a música, o cântico, as ações de graças, os gestos – com a própria adoração, e colhemos disso, no melhor dos casos, apenas momentos de conforto emocional, que não nos colocam em comunhão com o Deus vivo e pessoal a quem adoramos e não nos transformam.
Os verdadeiros adoradores são, eles mesmos, simultaneamente, o local e a expressão da adoração, com suas vidas constante e conscientemente colocadas na Presença para serem transformadas em Sua Imagem e para refletirem Sua glória.
Jesus afirmou que é do interior que fluem os rios de água viva. É no íntimo do nosso ser que está o centro dinâmico e vital da existência, onde o Espírito Santo habita e opera, fazendo a vida fluir.
O Espírito vem fazer morada “em nós”, isto é, dentro de nós. Esse é o fato mais tremendo da história humana. O Deus Criador habitando em Sua criatura. No entanto, frequentemente nos esquecemos ou não estamos atentos a essa Presença em nosso íntimo, ocupados e distraídos que ficamos com as demandas da realidade exterior.
d) Mateus 15:16-29; 23: 25-28
Jesus afirma que a contaminação do homem vem do coração, e não de suas ações exteriores. A religiosidade cerimonial, por ser exterior, não garante a saúde espiritual do homem. No entanto, um interior contaminado torna impura a pessoa inteira.
O grande problema dos fariseus era a incoerência entre a vida interior e a exterior. Exteriormente, podiam mostrar um comportamento religioso irrepreensível, mas interiormente estavam cheios de impurezas. Deus não lida com nossa aparência, mas com nosso coração.
Sem uma vida interior verdadeira assumimos uma falsa piedade, nos tornando hipócritas, contraditórios, enfermos de alma e de corpo.
e) Lucas 17:21
Jesus diz que o Reino de Deus não vem com visível aparência, mas que ele está “dentro” de nós. Pensamos muito nas manifestações externas do Reino, mas é dentro de nós que ele de fato está. É no nosso coração que o Reino deve se estabelecer e crescer, para que possa gerar frutos e produzir obras aceitáveis a Deus.
Assim, buscar o Reino de Deus em primeiro lugar deve ser também e principalmente buscar encontrá-lo dentro de nós, na habitação interior do Espírito, na comunhão íntima com o Pai.
f) Filipenses 2:13
Deus opera “dentro” de nós, em nosso ser, o querer e o realizar. Ambas são operações interiores. O “querer” se refere à purificação da nossa vontade, do nosso amor, enquanto o “realizar” diz respeito ao poder espiritual necessário para viver a santidade.
Há uma atuação contínua do Espírito em nosso homem interior a moldar os sentimentos, pensamentos, e intenções e a capacitá-lo a viver de acordo com o querer de Deus. Precisamos estar atentos a esse agir de Deus em nós pois não somos totalmente passivos. Temos que buscar e receber voluntariamente o que o Senhor faz fluir em nós.
g) Romanos 5:5; 7:22; 8:11,16,23 e seguintes; 12:1-2; 14:17
O amor de Deus é derramado nos nossos corações. É uma operação interior, espiritual, uma transmissão de vida, uma comunicação, um poder transformador que opera dentro do homem.
A vida no Espírito, descrita em Romanos 8, é essencialmente interior, operado no íntimo, na natureza humana. Essa é a fundamental distinção em relação à lei do pecado e da morte, ineficaz para transformar o homem.
Um aspecto fundamental dessa transformação interior é a renovação da mente. Nossos conceitos, pensamentos, ideias, valores e percepções precisam ser transformados para que possamos oferecer um culto coerente a Deus e conhecer Sua vontade.
h) 1a aos Coríntios 1:18-25; 2:6-16; 6:19
A presença e atuação do Espírito Santo em nós nos transformam de “homens psíquicos” em “homens pneumáticos”.
O homem psíquico é o homem natural, que vive sem conhecimento da Realidade e é limitado por suas faculdades corrompidas pelo pecado e desconectadas de Deus.
O Espírito sonda as profundezas de Deus e se comunica conosco em nosso íntimo. A partir dessa nova perspectiva, o homem espiritual pode discernir todas as coisas, pois está sendo formada nele a mente de Cristo.
i) Efésios 4:23
A renovação do “espírito do entendimento” é essencial para que se possa despir o velho homem e se revestir do novo. Trata-se de uma transformação que deve ocorrer no nosso “homem interior”.
Não é possível assumir a nova natureza gerada pelo Espírito Santo se não passamos por um processo de transformação interior que envolve nosso pensamento, entendimento, vontades, valores etc.
j) Gálatas 5:16-25
O fruto do Espírito é uma completa transformação interior. Não se refere a exterioridades ou a práticas determinadas, não é produto de esforço, mas de uma ação direta, interna, de Deus na nossa natureza humana.
Para que ele se produza é necessário que “andemos no Espírito”, isto é, que estejamos a todo momento escolhendo conscientemente o que agrada ao Senhor para que ele gere em nós Sua própria vida e caráter.
k) 2a aos Coríntios 3:12-18; 4:16, 18
Quando nos convertemos é retirado o véu do coração e podemos contemplar Deus diretamente, face a face, como Moisés. Esse “olhar” para o Senhor não é físico, exterior, mas espiritual, interior, e é essa união íntima com Ele que nos transforma.
A operação da fé, a busca dos valores eternos do Reino e até mesmo as perseguições fazem com que, embora o homem exterior possa se corromper, o homem interior se renove para uma existência eterna.
l) Efésios 3:14-21
Paulo ora para que os cristãos sejam fortalecidos com poder no homem interior, onde Cristo habita pela fé.
“É a pressuposição constante, ou ênfase específica, do ensino do Novo Testamento, de que a força para a vida cristã vem através da habitação do Espírito Santo na pessoa do crente... a expressão “homem interior” pode incluir, ou pelo menos afetar, tudo o que o Novo Testamento quer dizer por coração, mente, vontade e espírito. É o núcleo da personalidade, onde o Espírito procura fazer sua habitação e a partir daí transformar toda a vida de um homem”.
Francis Foulkes, “Efésios, Introdução e Comentário”, ed. Vida Nova/Mundo Cristão.
Deus comunica seu poder santificador em nosso homem interior para nos regenerar, nos transformar em Sua própria natureza e Imagem e continuamente sustentar nossa vida.
m) Colossenses 1:27-28
“Cristo em nós”, dentro de nós, habitando e transformando nosso ser. Essa é a síntese do plano de Deus para ter uma família de filhos semelhantes a Ele.
Jesus precisa ser formado em (dentro de) nós, antes de ser manifestado por meio de nós. O Espírito deve fortalecer nosso homem interior, para que possa veicular Seu poder através de nós. O Espírito nos vivifica a partir do interior, onde Ele habita e de onde transmite sua graça transformadora.
Ele se manifesta dentro de nós com sua revelação e dons, antes de nos usar como instrumentos. O Reino precisa crescer em (dentro de) nós antes de se expandir através do nosso serviço. Precisamos desenvolver nossas faculdades e habilidades espirituais, antes de nos aperfeiçoarmos nas naturais.
A santidade é essencialmente produto de uma ação sobrenatural do Espírito de Deus em nós, seu fruto, e não consequência de nossas escolhas e ações, que podem, no máximo, permitir ou impedir a ação do Espírito, mas jamais dar-lhe substância.
Seu conservo e companheiro de jornada,
Fernando
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